o mito o que tem
é que alimenta a esperança
nos inspira
sabe bem
e é bonito
quando tira o véu da nebelina
e abre o pedaço de céu rasgado onde habita
de onde sai de vez em quando
em nós tudo se agita
tudo fica imaculado e lindo
desejado mesmo
e se o mito é mito porque não morreu
é por isso
que não me arrisco a "matar" ninguém
se eu o não faço
porque havia de fazê-lo Deus(?)
a vida é vida
há-de sê-lo sempre
mesmo para lá da morte aparente
o mito é o maior exemplo disso
vive o mito
vive el rei D. Sebastião
sábado, dezembro 31, 2005
Senhor da boa sorte
fui à capelinha do Senhor da boa sorte
um ermo só e abandonado
com pedras de sobra e distância pobre
onde só erva daninha cresce
onde o silêncio corta
e o silvo do vento assobia
ali o que é mais forte
é a esperança o perdão a fé
e também a confiança
que transmite a imagem silente e triste
do Jesus pregado na cruz
aceitando a morte
e naquele ermo deserto
naquele corpinho frágil de Jesus
tanta gente a pedir o abraço
a encontrar conforto em seu cansaço
apenas olhando
falando
não há razão nisto
eu sei que não
mas que é verdade que conforta
e que se sente aquele abraço
uma força forte
que o diga o coração
um ermo só e abandonado
com pedras de sobra e distância pobre
onde só erva daninha cresce
onde o silêncio corta
e o silvo do vento assobia
ali o que é mais forte
é a esperança o perdão a fé
e também a confiança
que transmite a imagem silente e triste
do Jesus pregado na cruz
aceitando a morte
e naquele ermo deserto
naquele corpinho frágil de Jesus
tanta gente a pedir o abraço
a encontrar conforto em seu cansaço
apenas olhando
falando
não há razão nisto
eu sei que não
mas que é verdade que conforta
e que se sente aquele abraço
uma força forte
que o diga o coração
menina do mar
rodeada assim de mar
grande
com seus segredos
que vêm do fundo e do longe
altos rochedos
onde encostam ondas rebentando
rodeadas de barcos e gaivotas
de areais esquecidos no tempo
entre um caminho de mar e um caminho de Lisboa
ficas tu menina de água
olhos que se abrem pela manhã
esquecidos
preguiçosos
ainda adormecidos
espreitando por entre a névoa
o sol que há-de vir
e há-de mostrar (quem sabe)
uma vida a sorrir
e o sol aparece
alegram-se as dunas
por te ver passar
alegram-se as ondas para te molhar
o velho castelo sorri
para te saudar
a Berlenga é barco para te levar
que mais queres tu
menina do mar(?)
grande
com seus segredos
que vêm do fundo e do longe
altos rochedos
onde encostam ondas rebentando
rodeadas de barcos e gaivotas
de areais esquecidos no tempo
entre um caminho de mar e um caminho de Lisboa
ficas tu menina de água
olhos que se abrem pela manhã
esquecidos
preguiçosos
ainda adormecidos
espreitando por entre a névoa
o sol que há-de vir
e há-de mostrar (quem sabe)
uma vida a sorrir
e o sol aparece
alegram-se as dunas
por te ver passar
alegram-se as ondas para te molhar
o velho castelo sorri
para te saudar
a Berlenga é barco para te levar
que mais queres tu
menina do mar(?)
no fim da estrada
seguia pela estrada a grande velocidade
era desconforme a música que ouvia
os olhos fixavam hirtos o asfalto
era uma tempestade o que eu sentia
o rumo não era um rumo certo
a noite era rainha de mim
e transmitia aquele sabor amargo a solidão
no caminho incerto que seguia
é daquelas alturas em que apetece gritar
(mas não se grita)
soltar gemidos no vento
chorar
e a pressa que se sente
a guiar a guiar
esconde um desejo inconsciente
de nunca querer chegar
mas pela frente encontramos sempre
o mar
um muro
o fim da estrada
ou gente
ainda bem que eras tu quem estava
quando a corrida sem fim
parou
e contigo pude conversar enfim
coisas banais mas coisas boas
trocar tempo por tempo
acalmar um pouco as minhas máguas
e dares-me o que deste
foi para mim
o melhor presente
na tempestade agreste
era desconforme a música que ouvia
os olhos fixavam hirtos o asfalto
era uma tempestade o que eu sentia
o rumo não era um rumo certo
a noite era rainha de mim
e transmitia aquele sabor amargo a solidão
no caminho incerto que seguia
é daquelas alturas em que apetece gritar
(mas não se grita)
soltar gemidos no vento
chorar
e a pressa que se sente
a guiar a guiar
esconde um desejo inconsciente
de nunca querer chegar
mas pela frente encontramos sempre
o mar
um muro
o fim da estrada
ou gente
ainda bem que eras tu quem estava
quando a corrida sem fim
parou
e contigo pude conversar enfim
coisas banais mas coisas boas
trocar tempo por tempo
acalmar um pouco as minhas máguas
e dares-me o que deste
foi para mim
o melhor presente
na tempestade agreste
verdes anos
adolescência tão bonita
(e tão inquieta)
tão cheia de surpresa
e de alquimia
parece que o tempo é tanto tempo
a força tanta
que a noite e dia
são linha recta na distância
bebe-se o mosto
vai-se ao bailarico
e logo pulando e dançando
se aprende o sabor da dança
também se esmorece
mas logo uma asneira
um grito
saem à maneira
assim se cresce
a namorada o amigo
a aventura o sonho
as férias a escola
e nada significa nada
o mundo está todo ali
na escola no bairro
nos amigos nos livros
na ilusão
e também num beijo
a vida é um imenso verão
(e tão inquieta)
tão cheia de surpresa
e de alquimia
parece que o tempo é tanto tempo
a força tanta
que a noite e dia
são linha recta na distância
bebe-se o mosto
vai-se ao bailarico
e logo pulando e dançando
se aprende o sabor da dança
também se esmorece
mas logo uma asneira
um grito
saem à maneira
assim se cresce
a namorada o amigo
a aventura o sonho
as férias a escola
e nada significa nada
o mundo está todo ali
na escola no bairro
nos amigos nos livros
na ilusão
e também num beijo
a vida é um imenso verão
menino de África

olhar inocente vindo ao mundo sem pedir
porquê?
criança de África com olhos para ver
o que não tem nada para ver
nem é bonito
quem te fez assim
menino negro
rodeado de espingardas de fome de medo
de doença
quem pode ser tão mau
e mata assim tua inocência?
menino é menino em toda a parte
tem que brincar e tem que rir
tem que ter pai tem que ter mãe
amigos
um jardim
e não ser assim como tu és
menino velho sem forças
nascido morto
ou morrendo vivo
mas passa o tempo e ninguém semeia
para ti
perdido na noite
esquecido de Londres Paris ou Nova Iorque
uma seara de paz uma fábrica de brinquedos
pão
coisas simples e bonitas como tu
menino de África
para te ver feliz
e enfim vencer a solidão
a ausência permanente
esse abandono
que crime que é só de ver-te assim
esses olhos grandes
de tristeza tão triste
que impotência total
que ingratidão tamanha
porquê?
criança de África com olhos para ver
o que não tem nada para ver
nem é bonito
quem te fez assim
menino negro
rodeado de espingardas de fome de medo
de doença
quem pode ser tão mau
e mata assim tua inocência?
menino é menino em toda a parte
tem que brincar e tem que rir
tem que ter pai tem que ter mãe
amigos
um jardim
e não ser assim como tu és
menino velho sem forças
nascido morto
ou morrendo vivo
mas passa o tempo e ninguém semeia
para ti
perdido na noite
esquecido de Londres Paris ou Nova Iorque
uma seara de paz uma fábrica de brinquedos
pão
coisas simples e bonitas como tu
menino de África
para te ver feliz
e enfim vencer a solidão
a ausência permanente
esse abandono
que crime que é só de ver-te assim
esses olhos grandes
de tristeza tão triste
que impotência total
que ingratidão tamanha
terça-feira, dezembro 13, 2005
cacto algarvio
trouxe um cacto comigo do teu jardim sul florido
num daqueles dias em que um pouco de dar sabe tão bem
por isso corri estrada fora
coração quente
trazia-te um pouco a ti
(queria eu crer que trazia)
e o mundo era pequeno para tanto sentimento
a árvore grande em tamanho pequenino
(o cacto)
parecia que o sabia
aninhava-se ela também feliz no assento
olhava para mim
(sorria)
finda a viagem teve honras de pousar em minha casa
em lugar onde de todo o lugar se via
e deu-se bem
porque eu via nela em cada folha em cada braço
o tempero a harmonia
o teu abraço
e que bem que eu lhe queria
um dia destes
murchou
morreu
o cacto
talvez por saber que tu casaste
(pensei eu)
e me ver triste
sentiu cansaço
e foi de amores que se perdeu
num daqueles dias em que um pouco de dar sabe tão bem
por isso corri estrada fora
coração quente
trazia-te um pouco a ti
(queria eu crer que trazia)
e o mundo era pequeno para tanto sentimento
a árvore grande em tamanho pequenino
(o cacto)
parecia que o sabia
aninhava-se ela também feliz no assento
olhava para mim
(sorria)
finda a viagem teve honras de pousar em minha casa
em lugar onde de todo o lugar se via
e deu-se bem
porque eu via nela em cada folha em cada braço
o tempero a harmonia
o teu abraço
e que bem que eu lhe queria
um dia destes
murchou
morreu
o cacto
talvez por saber que tu casaste
(pensei eu)
e me ver triste
sentiu cansaço
e foi de amores que se perdeu
heroína fatal
curvado atrás de mim
forças pequenas
num jeito que faz lembrar um condenado
a cor é baça acastanhada
o futuro sem lonjura está numa moeda
coitado
onde encontrar razão para este quadro
de miséria
de rendição à morte antecipada
quem pede tal sacrifício
e quem por ele se salva
(alguém se salva?)
onde encontrar um argumento
que encubra tanta lama
chego a crer
que é tal o desespero
naquela cabeça já disforme
suja esfarrapada
que a vida vista dali
daqueles olhos jovens moribundos
deve traduzir-se em droga numa moeda
num fôlego supostamente renovado
para ficar vivo só por medo de morrer
o mundo que importa o mundo?
esse é lá fora para lá do muro
e não há lugar nele
perdida que foi já a carruagem
o combóio da esperança
só resta mesmo aguentar a vida a qualquer preço
seco sujo torto esfarrapado
até já não poder
forças pequenas
num jeito que faz lembrar um condenado
a cor é baça acastanhada
o futuro sem lonjura está numa moeda
coitado
onde encontrar razão para este quadro
de miséria
de rendição à morte antecipada
quem pede tal sacrifício
e quem por ele se salva
(alguém se salva?)
onde encontrar um argumento
que encubra tanta lama
chego a crer
que é tal o desespero
naquela cabeça já disforme
suja esfarrapada
que a vida vista dali
daqueles olhos jovens moribundos
deve traduzir-se em droga numa moeda
num fôlego supostamente renovado
para ficar vivo só por medo de morrer
o mundo que importa o mundo?
esse é lá fora para lá do muro
e não há lugar nele
perdida que foi já a carruagem
o combóio da esperança
só resta mesmo aguentar a vida a qualquer preço
seco sujo torto esfarrapado
até já não poder
quarta-feira, dezembro 07, 2005
loucura
havia um redemoínho de vento
ela parecia tonta
cara aberta
olhos arregalados
dançava com a poeira e o vento
com gestos largos descompostos
gemia
cantarolava
as saias levantavam desgarradas
os braços agitavam-se
imploravam em direcções indefenidas
tal a cegueira da dor que a movia
o céu estava negro
em redor um ermo desolado
nada havia ali se não aquele dança
e aquele grito
quando o vento amainou
rodopiando sempre ao subir o monte
levou a mulher servindo-lhe de manto
ou de colete de forças
ou de carrasco
e naquele lugar
ficou apenas
o eco da sua voz
o jeito da sua dança
um ritual perfeito de dor
e de revolta
só Deus saberá porquê
ela parecia tonta
cara aberta
olhos arregalados
dançava com a poeira e o vento
com gestos largos descompostos
gemia
cantarolava
as saias levantavam desgarradas
os braços agitavam-se
imploravam em direcções indefenidas
tal a cegueira da dor que a movia
o céu estava negro
em redor um ermo desolado
nada havia ali se não aquele dança
e aquele grito
quando o vento amainou
rodopiando sempre ao subir o monte
levou a mulher servindo-lhe de manto
ou de colete de forças
ou de carrasco
e naquele lugar
ficou apenas
o eco da sua voz
o jeito da sua dança
um ritual perfeito de dor
e de revolta
só Deus saberá porquê
português de barrozelas
vestido de automóvel a rigor
jeep à boa maneira americana
lá vai português de barrozelas
entornado em dívidas e estilo
levando na algibeira um monte de cartões
para pagar fiado
adiantado
o que ainda não ganhou
em casa deixou mobílias
no mínimo século XV
que o banco lhe ofertou
por esperteza sua
aumentando-lhe o montante do empréstimo
da casa que comprou
leva também artigos desportivos
roupas de marca
tudo fiado
mas para quem o vê chegar
a imagem é de grande estilo
e atenção
"o senhor doutor" vais-se apear
traz a família
o cão de luxo
e tudo o que já disse
só que para espanto meu
o "senhor doutor" português de barrozelas
se esqueceu
de tirar as horríveis meias brancas
e as ceroulas de flanela
que aparecem ao fundo da imagem
pousando nos sapatinhos amarelos
jeep à boa maneira americana
lá vai português de barrozelas
entornado em dívidas e estilo
levando na algibeira um monte de cartões
para pagar fiado
adiantado
o que ainda não ganhou
em casa deixou mobílias
no mínimo século XV
que o banco lhe ofertou
por esperteza sua
aumentando-lhe o montante do empréstimo
da casa que comprou
leva também artigos desportivos
roupas de marca
tudo fiado
mas para quem o vê chegar
a imagem é de grande estilo
e atenção
"o senhor doutor" vais-se apear
traz a família
o cão de luxo
e tudo o que já disse
só que para espanto meu
o "senhor doutor" português de barrozelas
se esqueceu
de tirar as horríveis meias brancas
e as ceroulas de flanela
que aparecem ao fundo da imagem
pousando nos sapatinhos amarelos
atenção breve
basta pôr um ar de estar à venda
uma saia curta
um piscar de olho
e freguesia não falta
há sempre quem compre um grama de prazer
uma atenção breve
uma companhia fugaz
há um vazio preenchido
uma ira descarregada
um fulgor a mais que tem de encontrar
maneira de descarregar
mulher explorada
vexada
ofendida
mas quantas vezes o único refúgio
fácil
a um alívio à dor e à solidão de tantos
neste contexto
considero as prostitutas um serviço social
uma missão digna de respeito
e que apesar da perdição
a que inevitavelmente leva
não deixa de inspirar
um fatalismo trágico
só comparável ao de um mártir
ou de um monge em sacrifício permanente
não é esta prostituição que mais ofende
há maneiras super requintadas
na nossa sociedade civilizada
mediatizada
de vender o corpo e até a alma
e de levar o egoísmo e a ganância
a patamares de luxúria
que esses sim me metem nojo
uma saia curta
um piscar de olho
e freguesia não falta
há sempre quem compre um grama de prazer
uma atenção breve
uma companhia fugaz
há um vazio preenchido
uma ira descarregada
um fulgor a mais que tem de encontrar
maneira de descarregar
mulher explorada
vexada
ofendida
mas quantas vezes o único refúgio
fácil
a um alívio à dor e à solidão de tantos
neste contexto
considero as prostitutas um serviço social
uma missão digna de respeito
e que apesar da perdição
a que inevitavelmente leva
não deixa de inspirar
um fatalismo trágico
só comparável ao de um mártir
ou de um monge em sacrifício permanente
não é esta prostituição que mais ofende
há maneiras super requintadas
na nossa sociedade civilizada
mediatizada
de vender o corpo e até a alma
e de levar o egoísmo e a ganância
a patamares de luxúria
que esses sim me metem nojo
três verbos
tudo definido em três verbos
vir
estar
ir
tudo uma passagem
um instante
que dura tanto
quanto mais pesada é
ou leve
a vida que levamos
e vimos e vamos
como se de searas se tratasse
em ciclo de colheita
ou de pousio
terras semeadas
logo abandonadas
e o chão que andamos
as marcas que deixamos
são testemunhos com o valor e o sentido que têm
às vezes engrandecidos
ampliados
conforme os tempos e as causas
outras vezes
quase sempre
um ténue passar de uma fagulha
que mal deixa rasto
leve e breve
sobe
encurta a chama
sobe pouco e simplesmente apaga
vir
estar
ir
tudo uma passagem
um instante
que dura tanto
quanto mais pesada é
ou leve
a vida que levamos
e vimos e vamos
como se de searas se tratasse
em ciclo de colheita
ou de pousio
terras semeadas
logo abandonadas
e o chão que andamos
as marcas que deixamos
são testemunhos com o valor e o sentido que têm
às vezes engrandecidos
ampliados
conforme os tempos e as causas
outras vezes
quase sempre
um ténue passar de uma fagulha
que mal deixa rasto
leve e breve
sobe
encurta a chama
sobe pouco e simplesmente apaga
utopia de ti
gostava de criar um espaço utópico contigo
em que a tua vida e a minha não contassem
tu serias o sol eu o poema
tu levarias o mar à minha serra
eu seria a serra do teu mar
e as lágrimas que chorasses
ou eu
e os risos
seriam o orvalho da terra e rosmaninho
espalhados nas neblinas encantadas do oceano
nesse espaço só nosso
sul norte
nascente poente
fantasia
sem tempo nem onde
tudo podia acontecer
porque nada era verdade
em que a tua vida e a minha não contassem
tu serias o sol eu o poema
tu levarias o mar à minha serra
eu seria a serra do teu mar
e as lágrimas que chorasses
ou eu
e os risos
seriam o orvalho da terra e rosmaninho
espalhados nas neblinas encantadas do oceano
nesse espaço só nosso
sul norte
nascente poente
fantasia
sem tempo nem onde
tudo podia acontecer
porque nada era verdade
terça-feira, dezembro 06, 2005
mãe solteira
foi de repente
lá na terra
que a moçoila mais linda
mais amada
mais folgazona
mais anjo
virou diabo sacrilégio amante
puta
só porque caíu na asneira
de ser mãe solteira
por ter amado alguém e ter-se dado
gostar dela agora como se gostava dantes
quando no rancho pulava dançava e era bandeira
é arriscar meter em sua casa
ditos mexericos
estar com o pecado e a desonra à sua porta
coitada da Rosita
nem parece ela
emagreceu não sai de casa
o próprio pai
homem honrado mal lhe fala
secou-lhe o olhar e o rosto
de quem parece ter vivido e não viveu
murchou a pequena Rosa
e assim com o dedo apontado
um filho nos braços
um desdém que mata
Rosita foi crucificada
não aguentou a ideia de matar-se
nem a de viver ali
fugiu para a cidade
e lá tudo é mais fácil
é prostituta
droga-se
e ninguém liga
lá na terra
que a moçoila mais linda
mais amada
mais folgazona
mais anjo
virou diabo sacrilégio amante
puta
só porque caíu na asneira
de ser mãe solteira
por ter amado alguém e ter-se dado
gostar dela agora como se gostava dantes
quando no rancho pulava dançava e era bandeira
é arriscar meter em sua casa
ditos mexericos
estar com o pecado e a desonra à sua porta
coitada da Rosita
nem parece ela
emagreceu não sai de casa
o próprio pai
homem honrado mal lhe fala
secou-lhe o olhar e o rosto
de quem parece ter vivido e não viveu
murchou a pequena Rosa
e assim com o dedo apontado
um filho nos braços
um desdém que mata
Rosita foi crucificada
não aguentou a ideia de matar-se
nem a de viver ali
fugiu para a cidade
e lá tudo é mais fácil
é prostituta
droga-se
e ninguém liga
ciclo do guerreiro
para que a conquista saiba bem e apeteça
tem que ser difícil
que o diga o nosso primeiro rei
conquistador
afiando a espada contra a mãe
ajeitando o escudo
lutador
lavado em sangue em suor
em pesadelo
zás trás catrapás
não deixava no lugar a mais perfeita das cabeças
e lá seguia com os outros
dando e levando
levando e dando
era assim a vida de conquistaa
dura difícil
depois sim
resolvida a contenda
na penumbra recatada do castelo
que bem que saberia ao nosso rei
cantar glória rodeado de ninfetas
embebido em fantasias
no ócio bom de quem só quem dá no duro
tem
era ver nas ameias altaneiras
os risinhos fraldiqueiros
e os êxtases quentinhos
a fazerem correr D. Afonso
descomposto e ofegante
pelos cantinhos
e o prazer que a coisa dava
tinha índices tamanhos
e tais desmandos
que logo o tédio chegava
e um tal cansaço nos guerreiros
de enjoos vómitos
caganeira
deixava adivinhar nova peleja
e o ciclo recomeçava
a partida dos heróis
o choro das ninfetas
o regresso dos heróis
e a recompensa
tem que ser difícil
que o diga o nosso primeiro rei
conquistador
afiando a espada contra a mãe
ajeitando o escudo
lutador
lavado em sangue em suor
em pesadelo
zás trás catrapás
não deixava no lugar a mais perfeita das cabeças
e lá seguia com os outros
dando e levando
levando e dando
era assim a vida de conquistaa
dura difícil
depois sim
resolvida a contenda
na penumbra recatada do castelo
que bem que saberia ao nosso rei
cantar glória rodeado de ninfetas
embebido em fantasias
no ócio bom de quem só quem dá no duro
tem
era ver nas ameias altaneiras
os risinhos fraldiqueiros
e os êxtases quentinhos
a fazerem correr D. Afonso
descomposto e ofegante
pelos cantinhos
e o prazer que a coisa dava
tinha índices tamanhos
e tais desmandos
que logo o tédio chegava
e um tal cansaço nos guerreiros
de enjoos vómitos
caganeira
deixava adivinhar nova peleja
e o ciclo recomeçava
a partida dos heróis
o choro das ninfetas
o regresso dos heróis
e a recompensa
sábado, dezembro 03, 2005
guardar o essencial
não vou procurar mais por opção
antes reduzir caminhos
guardar o essencial
talvez alivie assim o coração
e torne a vida mais sensata
há escolhas a fazer e vou fazê-las
a dispersão cansa
e não há tantas mãos assim
para agarrar tudo
vou ter que deitar coisas fora
começarei por ti
que foste estrada
sonho
um lugar movido pelo desejo
que encheste de fantasia um tempo
um espaço
uma loucura
(até me convenci de que eras possível)
começarei por ti
porque és um caso difícil
sempre adiado
e ocupas muito espaço com muito vazio
mesmo assim
não poderei dispensar-te depressa
virar simplesmente a página
não
vou fazer como um fumador que conheço fez
deixou de fumar reduzindo a dose
lentamente
até que fumou o último cigarro
e teve o cuidado
mesmo já vencido o vício
de trazer sempre cigarros consigo
com medo que lhe fizessem falta
assim eu farei contigo
antes reduzir caminhos
guardar o essencial
talvez alivie assim o coração
e torne a vida mais sensata
há escolhas a fazer e vou fazê-las
a dispersão cansa
e não há tantas mãos assim
para agarrar tudo
vou ter que deitar coisas fora
começarei por ti
que foste estrada
sonho
um lugar movido pelo desejo
que encheste de fantasia um tempo
um espaço
uma loucura
(até me convenci de que eras possível)
começarei por ti
porque és um caso difícil
sempre adiado
e ocupas muito espaço com muito vazio
mesmo assim
não poderei dispensar-te depressa
virar simplesmente a página
não
vou fazer como um fumador que conheço fez
deixou de fumar reduzindo a dose
lentamente
até que fumou o último cigarro
e teve o cuidado
mesmo já vencido o vício
de trazer sempre cigarros consigo
com medo que lhe fizessem falta
assim eu farei contigo
ter ter e ter
a quantidade não leva a lado nenhum
o exagero
o carro à frente dos bois
o ter e ter e ter
o mais e mais e sempre mais
o cansaço que vem depois
a loucura que é deixar de ver
sem tempo nem jeito para sentir
é como estar sempre a fazer a prova oral
o exame difícil
levar inquietação ao lugar da paz
confusão ao recanto mais simples
sem reparar
que à distância de um braço
pode haver uma flor
e regá-la para não morrer
pode ser
o mais lindo acto de amor
o exagero
o carro à frente dos bois
o ter e ter e ter
o mais e mais e sempre mais
o cansaço que vem depois
a loucura que é deixar de ver
sem tempo nem jeito para sentir
é como estar sempre a fazer a prova oral
o exame difícil
levar inquietação ao lugar da paz
confusão ao recanto mais simples
sem reparar
que à distância de um braço
pode haver uma flor
e regá-la para não morrer
pode ser
o mais lindo acto de amor
rádio e televisão 2002
concurso do melhor orgasmo
com viagem prometida aos vencedores
filmes pornográficos com dados e estatísticas
pontos altos de masturbação
a filha mais puta do ano
rádio e televisão 2002
o antídoto ao Cristo triste
que morreu na cruz para nos salvaar
mas que se lixe
não se mantêm atentas audiências
com missas pregadores
sonhos de santos implorando aos céus
ou revendo as cenas dramáticas do Calvário
já nem um bom romance tem adeptos
ou uma conversa amena em que se aprende
um dia destes deito a alma fora
porque não serve mais ter alma
nem decência
a grande moda agora é a decadência
e viver com ela
e morrer com ela
com viagem prometida aos vencedores
filmes pornográficos com dados e estatísticas
pontos altos de masturbação
a filha mais puta do ano
rádio e televisão 2002
o antídoto ao Cristo triste
que morreu na cruz para nos salvaar
mas que se lixe
não se mantêm atentas audiências
com missas pregadores
sonhos de santos implorando aos céus
ou revendo as cenas dramáticas do Calvário
já nem um bom romance tem adeptos
ou uma conversa amena em que se aprende
um dia destes deito a alma fora
porque não serve mais ter alma
nem decência
a grande moda agora é a decadência
e viver com ela
e morrer com ela
o quintal de minha mãe
com os sons diários da metralha
o contar de espingardas
o gigante da fome
a violência vendida em troco de audiência
não fazem mais sentido
os dias bonitos das ilhas do Pacífico
os lugares mansos e sagrados
os ribeiros virgens vertendo melodia
o branco puro e angelical dos picos das montanhas
morreram dez?
morreram mil?
a quem importa?
que a morte chegue por má sorte
que a morte chegue quando é chegada a hora
que se dane
mas nascer e encontrar logo à sua porta
um lamaçal
uma espingarda
um nojo de vida
um quintal em que as flores são corpos matados
do pai do irmão do amigo
o que nos faz ser assim gente
tão brutos cruéis e assassinos?
será que não há no coração do mundo
amor que baste para virar as coisas do avesso?
não há ninguém que diga o que se faça?
a partir de hoje
quando me disserem
que o senhor A
o senhor B
são pessoas de grande inteligência
e se tudo continuar na mesma
só posso soltar uma gargalhada com a inteligência deles
e olhá-los com convicto desprezo
cada vez mais
apetece recordar o quintal de minha mãe
onde as flores eram lindas
porque punha nelas muito amor
e as abelhas apareciam atraídas pelo cheiro
e pela cor
e davam mel
se a minha mãe pudesse
semearia pelo mundo os seus quintais
o contar de espingardas
o gigante da fome
a violência vendida em troco de audiência
não fazem mais sentido
os dias bonitos das ilhas do Pacífico
os lugares mansos e sagrados
os ribeiros virgens vertendo melodia
o branco puro e angelical dos picos das montanhas
morreram dez?
morreram mil?
a quem importa?
que a morte chegue por má sorte
que a morte chegue quando é chegada a hora
que se dane
mas nascer e encontrar logo à sua porta
um lamaçal
uma espingarda
um nojo de vida
um quintal em que as flores são corpos matados
do pai do irmão do amigo
o que nos faz ser assim gente
tão brutos cruéis e assassinos?
será que não há no coração do mundo
amor que baste para virar as coisas do avesso?
não há ninguém que diga o que se faça?
a partir de hoje
quando me disserem
que o senhor A
o senhor B
são pessoas de grande inteligência
e se tudo continuar na mesma
só posso soltar uma gargalhada com a inteligência deles
e olhá-los com convicto desprezo
cada vez mais
apetece recordar o quintal de minha mãe
onde as flores eram lindas
porque punha nelas muito amor
e as abelhas apareciam atraídas pelo cheiro
e pela cor
e davam mel
se a minha mãe pudesse
semearia pelo mundo os seus quintais
sexta-feira, dezembro 02, 2005
a ti Filipa
tens uma palavra quente e meiga
um nome que me faz tremer
uma auréola de enigma
de morrer
apetece sei lá seguir teus passos
ver o que tu vês
amar a quem tu amas
sentir por ti
o coração em chamas
caminhar sempre
subir descer andar
seguir ao pé de ti
como quem sente
que nada cansa nem o cansaço do próprio caminhar
e no fim da caminhada
que aconteça longa
(para os meus sentidos branda)
cair em teus braços abraçado
e fazer contigo
em silêncio sossegado
TUDO
e ao mesmo tempo nada
um nome que me faz tremer
uma auréola de enigma
de morrer
apetece sei lá seguir teus passos
ver o que tu vês
amar a quem tu amas
sentir por ti
o coração em chamas
caminhar sempre
subir descer andar
seguir ao pé de ti
como quem sente
que nada cansa nem o cansaço do próprio caminhar
e no fim da caminhada
que aconteça longa
(para os meus sentidos branda)
cair em teus braços abraçado
e fazer contigo
em silêncio sossegado
TUDO
e ao mesmo tempo nada
a uma querida amiga
sonhei um dia que na estrada antiga
que levava ao Luso e a Viseu
apareceria
uma via larga e apareceu
sonhei um dia ver naquele caminho
encanto maior do que o que tinha
(o palácio do Buçaco era de reis
Coimbra de doutores
a praia da Figueira de água fria)
eu passava simplesmente
gostava do que via
(gostaria?)
e nas curvas/contra curvas
apenas o silêncio e a nebelina
de um futuro por vir
sentia
mas tempo é só tempo
é isso e nada mais
e agora sinto que valeu a pena
sonhar Coimbra sonhar Viseu
encontrar o encanto
nos olhos teus
e no dia que nasce
na palavra que ecoa
na Beira (que é nossa)
a esperança renasce por ti
aqui em Lisboa
que levava ao Luso e a Viseu
apareceria
uma via larga e apareceu
sonhei um dia ver naquele caminho
encanto maior do que o que tinha
(o palácio do Buçaco era de reis
Coimbra de doutores
a praia da Figueira de água fria)
eu passava simplesmente
gostava do que via
(gostaria?)
e nas curvas/contra curvas
apenas o silêncio e a nebelina
de um futuro por vir
sentia
mas tempo é só tempo
é isso e nada mais
e agora sinto que valeu a pena
sonhar Coimbra sonhar Viseu
encontrar o encanto
nos olhos teus
e no dia que nasce
na palavra que ecoa
na Beira (que é nossa)
a esperança renasce por ti
aqui em Lisboa
teclando
gente gente
tudo ali no ecrã do PC
"pa mim pa ti"
ali escondida vi
lolita_lady
menina mulher
mulher menina
menina a crescer
a vida a sorrir
a pressa de ser
imaginei lolita
a mirar-se ao espelho
fresca
ladina
rapariga que cresce
a ver-se e a achar-se
e também a desejar mostrar-se
mas ainda escondida
(timidez dos sixteen?)
vai tentando
ensaiando
ousando
negando
e também fugindo
mas um dia
estou certo
lolita_lady aparece
tudo ali no ecrã do PC
"pa mim pa ti"
ali escondida vi
lolita_lady
menina mulher
mulher menina
menina a crescer
a vida a sorrir
a pressa de ser
imaginei lolita
a mirar-se ao espelho
fresca
ladina
rapariga que cresce
a ver-se e a achar-se
e também a desejar mostrar-se
mas ainda escondida
(timidez dos sixteen?)
vai tentando
ensaiando
ousando
negando
e também fugindo
mas um dia
estou certo
lolita_lady aparece
nick "joana slogy"
apareceste no pequeno ecrã
florindo como árvore gigantemente linda
pétalas brancas amarelas cor de rosa
caíam choviam do irreal
eras tu vestida de palavras
breves palavras do teu tempo
que em Coimbra afinal
é o mesmo tempo
que me deste a mim (pequena atenção)
instante/vida
uniu-me a ti a palavra e a flor
que a árvore cresça sempre e floresça
e a palavra escrita
seja o botão a abrir em vida
a saudade a dor e também o amor
dos que passamos sem rosto
e somos passageiros deste tempo
florindo como árvore gigantemente linda
pétalas brancas amarelas cor de rosa
caíam choviam do irreal
eras tu vestida de palavras
breves palavras do teu tempo
que em Coimbra afinal
é o mesmo tempo
que me deste a mim (pequena atenção)
instante/vida
uniu-me a ti a palavra e a flor
que a árvore cresça sempre e floresça
e a palavra escrita
seja o botão a abrir em vida
a saudade a dor e também o amor
dos que passamos sem rosto
e somos passageiros deste tempo
queima das fitas
a noite é linda
os jardins estão decorados
com montanhas de amor
a beira-rio está sempre fabulosa
ontem mesmo
a lua fazia reflexo no rio mondego
era o perfeito momento de paz
harmonia
e saudade
os jardins estão decorados
com montanhas de amor
a beira-rio está sempre fabulosa
ontem mesmo
a lua fazia reflexo no rio mondego
era o perfeito momento de paz
harmonia
e saudade
península de Peniche

quando a névoa levanta
e começam a raiar fios de sol
Peniche aparece com o seu mar
em península larga
de encantar
as gaivotas ecoam pelos ares
sons de barcos de rochedos
onde a água vem deitar
ondas carregadas de segredos
os pescadores navegam levam sonhos
alegria e mágua misturadas
para trás bem longe
vão deixando
a costa altaneira
pedregosa
locais de infância
a vida inteira
a cidade amuralhada
o cais
a nau dos corvos
a Berlenga que os saúda
quando passam
e ficam também a perder de vista
as praias de encantar
as dunas
com turistas sequiosos de encontrar
ali um porto
ali um sol
ali um mar
e começam a raiar fios de sol
Peniche aparece com o seu mar
em península larga
de encantar
as gaivotas ecoam pelos ares
sons de barcos de rochedos
onde a água vem deitar
ondas carregadas de segredos
os pescadores navegam levam sonhos
alegria e mágua misturadas
para trás bem longe
vão deixando
a costa altaneira
pedregosa
locais de infância
a vida inteira
a cidade amuralhada
o cais
a nau dos corvos
a Berlenga que os saúda
quando passam
e ficam também a perder de vista
as praias de encantar
as dunas
com turistas sequiosos de encontrar
ali um porto
ali um sol
ali um mar
vizinho amante
foi num ápice que desapareceu
vizinho amante
homem atraente
da minha escada da minha rua
homem sem nome
acelera inveterado
bonzão
que impressionava
só de o sentir perto
só de lhe sentir o cheiro
e sabia-se que em outra morada
tivera mulher
outra mulher
amante
supostamente bela
quem me dera ter o que ele tinha
desde o fato à gravata aos sapatos
a mulher a filha da mulher
e a outra
e os prazeres supostos dele
e de repente
outra mulher?
deixei de o ver
nem cheiro nem o lugar do cheiro
as flores usadas ficaram como duas rosas regadas
logo murchas
como a quem falta o alimento
e também o tratamento de luxo
a fachada
que o bonzão naquela maneira de ser assim
lhes dava
tratar-se-ia de um semeador de sonhos
ou de um simples jardineiro
que não sabe cuidar do seu jardim?
vizinho amante
homem atraente
da minha escada da minha rua
homem sem nome
acelera inveterado
bonzão
que impressionava
só de o sentir perto
só de lhe sentir o cheiro
e sabia-se que em outra morada
tivera mulher
outra mulher
amante
supostamente bela
quem me dera ter o que ele tinha
desde o fato à gravata aos sapatos
a mulher a filha da mulher
e a outra
e os prazeres supostos dele
e de repente
outra mulher?
deixei de o ver
nem cheiro nem o lugar do cheiro
as flores usadas ficaram como duas rosas regadas
logo murchas
como a quem falta o alimento
e também o tratamento de luxo
a fachada
que o bonzão naquela maneira de ser assim
lhes dava
tratar-se-ia de um semeador de sonhos
ou de um simples jardineiro
que não sabe cuidar do seu jardim?
a minha mulher
faz tempo já serra de Sintra meu amor
piquenique de um ontem em que te conheci
um olhar distantemente perto
entre o casario e o trem
que trazem Sintra ao Rossio
e que te trouxeram a mim e a ti
ali começou tudo
entre Sintra e o Rossio
ali te achei companheira por achar
e comecei a seguir o teu andar
Belém Lisboa a outra margem
olhos de Lisboa os teus
num rio que te viu nascer
as marchas populares
os bairros as gaivotas
com o Tejo sempre perto
cacilheiros encontrados
um porto um abrigo
um pai um amigo e tu sempre tu
coração grande e aberto
talvez por isso meu amor tu foste cais
e pousei em ti
meiga bela e boa
MULHER
abençoada Lisboa/mulher
que me deu tanto
e quem recebe tanto tem que ser grato
sou pouco o que te dou
pequeno
Sintra Rossio
Belém a outra margem
mulher estou aqui
piquenique de um ontem em que te conheci
um olhar distantemente perto
entre o casario e o trem
que trazem Sintra ao Rossio
e que te trouxeram a mim e a ti
ali começou tudo
entre Sintra e o Rossio
ali te achei companheira por achar
e comecei a seguir o teu andar
Belém Lisboa a outra margem
olhos de Lisboa os teus
num rio que te viu nascer
as marchas populares
os bairros as gaivotas
com o Tejo sempre perto
cacilheiros encontrados
um porto um abrigo
um pai um amigo e tu sempre tu
coração grande e aberto
talvez por isso meu amor tu foste cais
e pousei em ti
meiga bela e boa
MULHER
abençoada Lisboa/mulher
que me deu tanto
e quem recebe tanto tem que ser grato
sou pouco o que te dou
pequeno
Sintra Rossio
Belém a outra margem
mulher estou aqui
quarta-feira, novembro 30, 2005
um objecto apenas
se eu não falasse
se não sentisse
se não visse
se fosse apenas um objecto
parado na calçada que tu pisas
se o vento soprasse e eu fosse leve e levantasse
na brisa
e fosse apenas o que era
uma coisa que abrigasse nada
já não sofria
já não pensava
nem via o que queria e o que não queria
tu poderias pisar-me
não sentiria
tu poderias dizer tudo
não ouviria
não amava
não chorava
não ria
apenas existia ao sabor do vento
para quem quisesse pegar em mim
ou não quisesse
e poderia inutilizar-me simplesmente
que eu nada mesmo nada
sentiria
se não sentisse
se não visse
se fosse apenas um objecto
parado na calçada que tu pisas
se o vento soprasse e eu fosse leve e levantasse
na brisa
e fosse apenas o que era
uma coisa que abrigasse nada
já não sofria
já não pensava
nem via o que queria e o que não queria
tu poderias pisar-me
não sentiria
tu poderias dizer tudo
não ouviria
não amava
não chorava
não ria
apenas existia ao sabor do vento
para quem quisesse pegar em mim
ou não quisesse
e poderia inutilizar-me simplesmente
que eu nada mesmo nada
sentiria
o meu pai foi alguém
desço as escadas sobre o asfalto
a cidade grita
vêm barulhos de tudo o que mexe
perto ou longe
longe ou perto
apresso o passo vozes quase me rodeiam
na ânsia apressada de chegarem
parte um autocarro
e logo outro
uma grua descarrega ao lado
detritos nauseabundos
colhidos num aterro
que faço aqui?
que faz toda esta gente
absorvendo ecos apressando o passo
num espaço hostil
feio
onde não cresce sequer erva daninha
nem se vê o céu
nem o sol
tanta gente neste sítio de ninguém
quem se conhece?
quem?
o meu pai viveu na terra
morreu nela
e fez bem
era ele e pouca gente havia além dele
e tinha nome e sítio e horizonte
mandava nele
virava o leme para onde queria
aqui onde estou
olho à minha volta
além
ali
para este labirinto enxameado
anónimo atrapalhado
e simplesmente sinto
que o meu pai sim
foi ALGUÉM
a cidade grita
vêm barulhos de tudo o que mexe
perto ou longe
longe ou perto
apresso o passo vozes quase me rodeiam
na ânsia apressada de chegarem
parte um autocarro
e logo outro
uma grua descarrega ao lado
detritos nauseabundos
colhidos num aterro
que faço aqui?
que faz toda esta gente
absorvendo ecos apressando o passo
num espaço hostil
feio
onde não cresce sequer erva daninha
nem se vê o céu
nem o sol
tanta gente neste sítio de ninguém
quem se conhece?
quem?
o meu pai viveu na terra
morreu nela
e fez bem
era ele e pouca gente havia além dele
e tinha nome e sítio e horizonte
mandava nele
virava o leme para onde queria
aqui onde estou
olho à minha volta
além
ali
para este labirinto enxameado
anónimo atrapalhado
e simplesmente sinto
que o meu pai sim
foi ALGUÉM
flores de rosa tantas vezes
apareceste disfarçada em sol de inverno
vida por nascer
embrião de tudo por abrir
havia em ti o deslumbramento das neves dos glaciares
dos verdes mais abaixo debroados em castelos
havia um mar de prata cristalino
os sussurros longínquos de uma felicidade estranha
o sol não era quente
mas às vezes meu Deus aquecia mesmo
nasciam flores de rosa tantas vezes
nesse imenso horizonte inóspito e branco
o vento soprava sempre
e o sonho quente
o coração quente
arrefeciam
tal a intensidade e a força tempestiva das rajadas frias
eu sabia que não podia plantar um jardim do sul
naquele lugar
eu sabia que não podia colher ali um cacho de uvas
um brinco de cerejas
nem sentir o aroma da flor de luz saída das mimosas
mas o vento era forte e perdi a ideia das coisas
vestia-me de inverno se havia tempestade
vestia-me de roxo quando o degelo já tardava
vestia-me de branco quando a esperança morria
dava tudo a este sonho vestido de inverno
mesmo o calor que já não tinha
foi lonjura a mais para um rio de silêncio pequenino
acabei por achar a resposta no tempo
e quando a achei morri bastante
vida por nascer
embrião de tudo por abrir
havia em ti o deslumbramento das neves dos glaciares
dos verdes mais abaixo debroados em castelos
havia um mar de prata cristalino
os sussurros longínquos de uma felicidade estranha
o sol não era quente
mas às vezes meu Deus aquecia mesmo
nasciam flores de rosa tantas vezes
nesse imenso horizonte inóspito e branco
o vento soprava sempre
e o sonho quente
o coração quente
arrefeciam
tal a intensidade e a força tempestiva das rajadas frias
eu sabia que não podia plantar um jardim do sul
naquele lugar
eu sabia que não podia colher ali um cacho de uvas
um brinco de cerejas
nem sentir o aroma da flor de luz saída das mimosas
mas o vento era forte e perdi a ideia das coisas
vestia-me de inverno se havia tempestade
vestia-me de roxo quando o degelo já tardava
vestia-me de branco quando a esperança morria
dava tudo a este sonho vestido de inverno
mesmo o calor que já não tinha
foi lonjura a mais para um rio de silêncio pequenino
acabei por achar a resposta no tempo
e quando a achei morri bastante
terça-feira, novembro 29, 2005
Cume/Vila Garcia
numa aldeia sozinha
fria e pequenina
já longe na memória
havia uma escola
ruas com granito
uma professora linda
também havia
uma criança que aprendia
com as outras
as primeiras coisas difíceis de aprender
a criança aprendeu
cresceu
e essa criança que não é mais criança
teve hoje a notícia triste
de que a professora desse tempo
que lhe disse coisas
que lhe deu pão
que a aqueceu no frio
morreu
a criança que não é mais criança
sentiu tanta pena
como se fosse
um pedaço de mãe
e verteu por ela
uma lágrima de sangue
fria e pequenina
já longe na memória
havia uma escola
ruas com granito
uma professora linda
também havia
uma criança que aprendia
com as outras
as primeiras coisas difíceis de aprender
a criança aprendeu
cresceu
e essa criança que não é mais criança
teve hoje a notícia triste
de que a professora desse tempo
que lhe disse coisas
que lhe deu pão
que a aqueceu no frio
morreu
a criança que não é mais criança
sentiu tanta pena
como se fosse
um pedaço de mãe
e verteu por ela
uma lágrima de sangue
que segredo tu és
que saudade incontida que sinto por ti
que desejo que tenho de te ir buscar e viver em ti
que afecto tu tens que me perco com ele
e desperto
feliz
que segredo tu és
que ficas sem estar
que prendes sem querer
que pões a minha alma agarrada a ti
só me apetece ficar e partir contigo
que desejo que tenho de te ir buscar e viver em ti
que afecto tu tens que me perco com ele
e desperto
feliz
que segredo tu és
que ficas sem estar
que prendes sem querer
que pões a minha alma agarrada a ti
só me apetece ficar e partir contigo
deslumbramento português
Alípio sonhou
Alípio teve
mas o sonho era tão grande
e o mundo em Abravezes tão pequeno
que a dor logo chegou depois do amor
um amor que vestiu contos de fadas
tecidos suaves
brancura e lãs macias
cabelo doirado de anjo
em pedras rudes e contos inventados
de um coração totalmente oferecido e sem reservas
um amor que misturava a fantasia
de quem se dispunha a amar sem aprender
com uma realidade contida
de quem sabe o que faz quando se dá
o sonho aconteceu como acontece a cada português
a desilusão também
com o cair das primeiras chuvas
adivinhava-se outono em Abravezes
depois inverno rigoroso
porque quem dá tanto
em tamanho deslumbramento
vai pagar caro a falta do objecto que o causou
e pôr assim a vida em desatino
dar-se cem por cento
é exagero e pode causar dano
de tal forma
que só se for recuperável o erro
se poderá aprender com ele
Alípio teve
mas o sonho era tão grande
e o mundo em Abravezes tão pequeno
que a dor logo chegou depois do amor
um amor que vestiu contos de fadas
tecidos suaves
brancura e lãs macias
cabelo doirado de anjo
em pedras rudes e contos inventados
de um coração totalmente oferecido e sem reservas
um amor que misturava a fantasia
de quem se dispunha a amar sem aprender
com uma realidade contida
de quem sabe o que faz quando se dá
o sonho aconteceu como acontece a cada português
a desilusão também
com o cair das primeiras chuvas
adivinhava-se outono em Abravezes
depois inverno rigoroso
porque quem dá tanto
em tamanho deslumbramento
vai pagar caro a falta do objecto que o causou
e pôr assim a vida em desatino
dar-se cem por cento
é exagero e pode causar dano
de tal forma
que só se for recuperável o erro
se poderá aprender com ele
ciúme

falava contigo altas horas
as palavras saíam perturbadas
eu queria dizer-te que te amava
e que era grande o ciúme que sentia
mas era doentio o conteúdo
nem parecia eu a pessoa que falava
tu olhavas com olhos incrédulos
porque quase te chamava puta
a ti que podes não ser santa
nem anjo
nem flor
mas seguramente nunca foste uma rameira
a vergonha encheu-me a madrugada escura
ainda gritei para ver se os teus olhos fixos compreendiam
ainda berrei desculpa
implorei
mas os teus olhos ficaram tão vazios
tão zangados
que saiste do carro
muda magoada e só
a garganta secou em nó enorme bloqueando-me a voz
o meu esforço desfaleceu
e com os olhos semi-mortos
semi-loucos
vi-te sumir na primeira curva
entre sons histéricos de carros barulhentos
e corpos oferecidos da noite
as palavras saíam perturbadas
eu queria dizer-te que te amava
e que era grande o ciúme que sentia
mas era doentio o conteúdo
nem parecia eu a pessoa que falava
tu olhavas com olhos incrédulos
porque quase te chamava puta
a ti que podes não ser santa
nem anjo
nem flor
mas seguramente nunca foste uma rameira
a vergonha encheu-me a madrugada escura
ainda gritei para ver se os teus olhos fixos compreendiam
ainda berrei desculpa
implorei
mas os teus olhos ficaram tão vazios
tão zangados
que saiste do carro
muda magoada e só
a garganta secou em nó enorme bloqueando-me a voz
o meu esforço desfaleceu
e com os olhos semi-mortos
semi-loucos
vi-te sumir na primeira curva
entre sons histéricos de carros barulhentos
e corpos oferecidos da noite
sabes
sabes
quando olho os teus olhos
quando olho cada recanto de ti
sinto que o mundo está todo ali
descubro sempre coisas novas
és como um mapa
um livro
um pedaço do meu olhar saído de mim
um pedaço da minha alma
vertendo uma lágrima na tua
vertendo também um sonho
de eternidade
quando olho os teus olhos
quando olho cada recanto de ti
sinto que o mundo está todo ali
descubro sempre coisas novas
és como um mapa
um livro
um pedaço do meu olhar saído de mim
um pedaço da minha alma
vertendo uma lágrima na tua
vertendo também um sonho
de eternidade
caçador de labirinto
inicio sempre o mesmo ciclo
entusiasmo sonho nuvens
alguma realidade
uma noite mais longa
pensamentos imprecisos
como que a minha felicidade se esgota
em um qualquer labirinto
qual gato tentando caçar um rato
consegue salivar quase o alcançando
vai de buraco em buraco
chegando mesmo a tocar-lhe o rabo
mas nada
um gesto menos perfeito
uma incapacidade inexplicável
e o rato foge sempre
deixando o caçador esgotado
sem vontade de caçar
mas como é caçador
coitado
volta outra vez a caçar
e a errar
como que a felicidade do gato
como a minha
se situa no engodo da próxima caçada
entusiasmo sonho nuvens
alguma realidade
uma noite mais longa
pensamentos imprecisos
como que a minha felicidade se esgota
em um qualquer labirinto
qual gato tentando caçar um rato
consegue salivar quase o alcançando
vai de buraco em buraco
chegando mesmo a tocar-lhe o rabo
mas nada
um gesto menos perfeito
uma incapacidade inexplicável
e o rato foge sempre
deixando o caçador esgotado
sem vontade de caçar
mas como é caçador
coitado
volta outra vez a caçar
e a errar
como que a felicidade do gato
como a minha
se situa no engodo da próxima caçada
perdida no desejo
andaste pela noite perdida no desejo
tudo sabia bem porque era novidade
o homem boçal que te levou na dança
que te deu vinho
que te deu fumo
foi o mesmo que te levou pr'à cama
que se riu de ti
que se afastou de ti
porque não tinhas mais nada para dar
foste um corpo apenas nada mais
despojado de tudo
de honra
de glória
de palavras
ainda pior
de amor
de alma
só posso sentir pena
não do teu corpo
dos orgasmos que teve ou que não teve
corpo é corpo e a noite já passou
outras haverá e passarão também
tenho pena é de ti
porque falei contigo e eras linda
ria só por te ver rir e te querer bem
tinha gesto e olhos para ti
e coração
fiz da minha mão a tua mão
cheguei a ter um sonho em que coubesses
tudo sabia bem porque era novidade
o homem boçal que te levou na dança
que te deu vinho
que te deu fumo
foi o mesmo que te levou pr'à cama
que se riu de ti
que se afastou de ti
porque não tinhas mais nada para dar
foste um corpo apenas nada mais
despojado de tudo
de honra
de glória
de palavras
ainda pior
de amor
de alma
só posso sentir pena
não do teu corpo
dos orgasmos que teve ou que não teve
corpo é corpo e a noite já passou
outras haverá e passarão também
tenho pena é de ti
porque falei contigo e eras linda
ria só por te ver rir e te querer bem
tinha gesto e olhos para ti
e coração
fiz da minha mão a tua mão
cheguei a ter um sonho em que coubesses
atracção inevitável
transbordava de impaciência
o cansaço provocado pelas palavras
toldava a sabedoria
nada salvava a situação
caída num silêncio exausto
pedindo um aconchego de corpos
e o fim de uma tensão acumulada
quase me caía o copo que segurava
quase funcionava sem presisar de fazer nada
quase parecia por instantes
o menino de minha mãe
que força que se guarda na ansiedade
e que fraqueza também
que fome e que raiva ao mesmo tempo
que pudor social
que contenção impossível
no acto necessário quando tarda
na demora da atracção inevitável
o cansaço provocado pelas palavras
toldava a sabedoria
nada salvava a situação
caída num silêncio exausto
pedindo um aconchego de corpos
e o fim de uma tensão acumulada
quase me caía o copo que segurava
quase funcionava sem presisar de fazer nada
quase parecia por instantes
o menino de minha mãe
que força que se guarda na ansiedade
e que fraqueza também
que fome e que raiva ao mesmo tempo
que pudor social
que contenção impossível
no acto necessário quando tarda
na demora da atracção inevitável
domingo, novembro 27, 2005
menina de Lisboa

vejo-te passar menina de Lisboa
mesmo ao pé de mim
desenvolta e engraçada
elegante e desejada
fresca
como um amanhecer de orvalho
nos prados e nas eiras
como uma casinha branca
e quando passas
o ar que sai do espaço onde caminhas
parece vir beijar-me
e gosto
és assim como uma seara abanada pelo vento
bonita pelo sol quando está grada
loira
estonteante
com razões de sobra para encher a vista
quando passas
menina de lisboa
os meus olhos são todos para ti
ganham brilho
como um cometa rectilínio e brilhante
que na trajectória se ilumina muito
depois desaparece
murcha
entristece
talvez pela saudade
de não estares sempre a passar
mesmo ao pé de mim
desenvolta e engraçada
elegante e desejada
fresca
como um amanhecer de orvalho
nos prados e nas eiras
como uma casinha branca
e quando passas
o ar que sai do espaço onde caminhas
parece vir beijar-me
e gosto
és assim como uma seara abanada pelo vento
bonita pelo sol quando está grada
loira
estonteante
com razões de sobra para encher a vista
quando passas
menina de lisboa
os meus olhos são todos para ti
ganham brilho
como um cometa rectilínio e brilhante
que na trajectória se ilumina muito
depois desaparece
murcha
entristece
talvez pela saudade
de não estares sempre a passar
baixa por um mês
Albano estava como não estivera nunca
gasto farto estúpido
e após vinte anos de carreira
viu chegada a hora de meter baixa
o sítio em que trabalha e que partilha
com três mulheres iguais ao mobiliário
levaram-no a sentir pela vida
um fastio uma alergia inexplicáveis
queixara-se dos ossos
o médico acrescentou cansaço
e naquele ambiente de médico de família
mal sabia que tanto mal
o levaria
a uma cura total na Consolação
o iodo o mar o sol faziam bem
também a praia recheada de flores
que teve de ir vendo aos poucos
não lhe fossem criar incómodo à vista
e foi naquele mundo de flores
mergulhando esbracejando
pavoneando a falta de roupa
que Albano teve relações com uma americana
nesse dia não dormiu
teve receio de perder o juízo
habituado que não estava
a que lhe acontecesse na vida qualquer coisa
a baixa era só de quinze dias
essa a grande preocupação
mas com a maré de feição
veio num pulo a Lisboa
alargá-la para um mês
e conseguiu
telefonou ao chefe e compreendeu
em primeiro lugar a saúde de Albano
também o médico preferiu
a cura total à meia cura
e o nosso homem regressou
com o papel passado por um mês
mudou de cor
e ganhou brilho
falava e dava
recebia
comia mexia corria
e a Consolação testemunhava
dia a dia
uma cura total de banhos
num aconchego visceral
luso-americano
gasto farto estúpido
e após vinte anos de carreira
viu chegada a hora de meter baixa
o sítio em que trabalha e que partilha
com três mulheres iguais ao mobiliário
levaram-no a sentir pela vida
um fastio uma alergia inexplicáveis
queixara-se dos ossos
o médico acrescentou cansaço
e naquele ambiente de médico de família
mal sabia que tanto mal
o levaria
a uma cura total na Consolação
o iodo o mar o sol faziam bem
também a praia recheada de flores
que teve de ir vendo aos poucos
não lhe fossem criar incómodo à vista
e foi naquele mundo de flores
mergulhando esbracejando
pavoneando a falta de roupa
que Albano teve relações com uma americana
nesse dia não dormiu
teve receio de perder o juízo
habituado que não estava
a que lhe acontecesse na vida qualquer coisa
a baixa era só de quinze dias
essa a grande preocupação
mas com a maré de feição
veio num pulo a Lisboa
alargá-la para um mês
e conseguiu
telefonou ao chefe e compreendeu
em primeiro lugar a saúde de Albano
também o médico preferiu
a cura total à meia cura
e o nosso homem regressou
com o papel passado por um mês
mudou de cor
e ganhou brilho
falava e dava
recebia
comia mexia corria
e a Consolação testemunhava
dia a dia
uma cura total de banhos
num aconchego visceral
luso-americano
a tua mão
só via chão
contornos enviezados de betão
ruínas
um cheiro a morte
palavrões que não faziam sentido
acho que estava no mundo dos mortos-vivos
não sei se abri os olhos fechados pela vigília
colados para não querer ver mais
não sei se me chamaste
não sei o que aconteceu comigo
não sei o teu nome
só me lembro da tua mão
naquela noite por amanhecer
estendida
tão frágil quase como eu
mas estendida
a que me agarrei
e que me salvou a vida
contornos enviezados de betão
ruínas
um cheiro a morte
palavrões que não faziam sentido
acho que estava no mundo dos mortos-vivos
não sei se abri os olhos fechados pela vigília
colados para não querer ver mais
não sei se me chamaste
não sei o que aconteceu comigo
não sei o teu nome
só me lembro da tua mão
naquela noite por amanhecer
estendida
tão frágil quase como eu
mas estendida
a que me agarrei
e que me salvou a vida
um lugar português
planalto agreste
desolado
frio e vento vertendo serranias
um sopro de lonjura vindo de Castela
uma lonjura imensa entre a minha aldeia e o mundo
nasce-se e morre-se e pouca gente dá conta
faz-me pensar um lugar assim
que quem nasceu nele
e o viu seco pelo sol
abanado pelo vento
só pode amá-lo muito
ou fugir dele
afinal ser português é isso
ficar e partir
e não é menos português quem parte
nem ama menos o lugar
entre ele a distância e o chegar
cresce um espaço enorme
(sentimento prtuguês)
porque ficamos sempre ali
e estamos sempre longe
desolado
frio e vento vertendo serranias
um sopro de lonjura vindo de Castela
uma lonjura imensa entre a minha aldeia e o mundo
nasce-se e morre-se e pouca gente dá conta
faz-me pensar um lugar assim
que quem nasceu nele
e o viu seco pelo sol
abanado pelo vento
só pode amá-lo muito
ou fugir dele
afinal ser português é isso
ficar e partir
e não é menos português quem parte
nem ama menos o lugar
entre ele a distância e o chegar
cresce um espaço enorme
(sentimento prtuguês)
porque ficamos sempre ali
e estamos sempre longe
dona menina gaja
um telemóvel em cada ouvido
voz bem colocada
um jeep enorme em cima do passeio
dona Menina Gaja
ia toda em cima da vida
como se tudo o que soubesse fosse
que só existia ela
não importava o que fazia
nem como
desde que o ego dela se salvasse
e avançava
ameaçadora e inflexível
já no balcão do café
exigia de quem a atendia
uma atenção quase tuberculosa
à sua voz
se não arriscar-se-ia
(o escravo do lado de lá)
a levar com segunda dose
percebi na vertigem de um minuto
problemas terríveis que enfrentava
comendo e falando aos telemóveis
não sabia se bahamas
se cuba
se república dominicana
se a festa era de noite
se de dia
se o programa metia strip-tease
ou não metia
se ia buscar a criança à escola
ou se não ia
tentei ouvir e concentrei-me
mas bastou uma ligeira distracção que tive
e quando o meu olhar quis recuperar
e correu do balcão para a rua
para a encontrar
já só vi a traseira do jeep
em jeito de traseira de rinoceronte
zarpar e fugir
voz bem colocada
um jeep enorme em cima do passeio
dona Menina Gaja
ia toda em cima da vida
como se tudo o que soubesse fosse
que só existia ela
não importava o que fazia
nem como
desde que o ego dela se salvasse
e avançava
ameaçadora e inflexível
já no balcão do café
exigia de quem a atendia
uma atenção quase tuberculosa
à sua voz
se não arriscar-se-ia
(o escravo do lado de lá)
a levar com segunda dose
percebi na vertigem de um minuto
problemas terríveis que enfrentava
comendo e falando aos telemóveis
não sabia se bahamas
se cuba
se república dominicana
se a festa era de noite
se de dia
se o programa metia strip-tease
ou não metia
se ia buscar a criança à escola
ou se não ia
tentei ouvir e concentrei-me
mas bastou uma ligeira distracção que tive
e quando o meu olhar quis recuperar
e correu do balcão para a rua
para a encontrar
já só vi a traseira do jeep
em jeito de traseira de rinoceronte
zarpar e fugir
apetece abraçar-te
contigo há sempre tudo por fazer
tudo por contar
as palavras amontoam-se na boca
a alegria nasce para não morrer nunca
apetece ser da tua equipa
vestir a mesma camisola
prender-te
como uma criança faz ao que ama e não quer mais largar
apetece abraçar-te
porque sinto que tens um abraço de mulher e de anjo
terno e quente
branco e envolvente
apetece que não aconteça nada
para não te distrair
e que fiques presa a mim
como se eu fora um brinquedo bom
um mago
um pedaço de luz intensa e hipnótica
e seria bom que fosse
porque no dia em que partisses
eu havia de lá estar para impedir-te
havia de ser a estrela incandescente
mágica
que te atrairia para sempre
tudo por contar
as palavras amontoam-se na boca
a alegria nasce para não morrer nunca
apetece ser da tua equipa
vestir a mesma camisola
prender-te
como uma criança faz ao que ama e não quer mais largar
apetece abraçar-te
porque sinto que tens um abraço de mulher e de anjo
terno e quente
branco e envolvente
apetece que não aconteça nada
para não te distrair
e que fiques presa a mim
como se eu fora um brinquedo bom
um mago
um pedaço de luz intensa e hipnótica
e seria bom que fosse
porque no dia em que partisses
eu havia de lá estar para impedir-te
havia de ser a estrela incandescente
mágica
que te atrairia para sempre
silêncio perdido no grito

as nuvens estão baixas
o ruído da chuva sobressai
nas vidraças amplas do escritório
há caravanas de campanha política
com sons conhecidos
vozes e alaridos
que se vão perdendo
engolidos pelos combóios rápidos
pelos aviões
pelos ruidos ininterruptos
de roncos de motores
pelo pisar de pneus no asfalto da avenida
há ainda sons histéricos de sirenes
outros gritos necessários
que interrompem o patamar normal de decibeis
observo atento o meu silêncio
e o contraste que ele é no contexto da cidade
é um silêncio perdido no grito
parece às vezes que transporto comigo
a minha terra
e o deserto que ela é
lá qualquer ruído se esgota no silêncio
ao contrário daqui
o ruído da chuva sobressai
nas vidraças amplas do escritório
há caravanas de campanha política
com sons conhecidos
vozes e alaridos
que se vão perdendo
engolidos pelos combóios rápidos
pelos aviões
pelos ruidos ininterruptos
de roncos de motores
pelo pisar de pneus no asfalto da avenida
há ainda sons histéricos de sirenes
outros gritos necessários
que interrompem o patamar normal de decibeis
observo atento o meu silêncio
e o contraste que ele é no contexto da cidade
é um silêncio perdido no grito
parece às vezes que transporto comigo
a minha terra
e o deserto que ela é
lá qualquer ruído se esgota no silêncio
ao contrário daqui
sábado, novembro 26, 2005
mergulho na memória
fecho profundamente os olhos
mergulho na memória
há retalhos de mim por tantos lados
parecem vidas distintas
pequenos excertos
aqui ali acolá
com pétalas e cardos
consoante Deus estava mais ou menos lá
por aí disperso
apenas o núcleo de referência
me tem mantido uno
e fiel a um caminhar principal
o tempo será quem faz o resto
não fico em lado nenhum porque ninguém fica
irei não sei bem onde porque ninguém sabe
mas sei que terei que ir para qualquer lado
que será da memória toda
que é luz e vida e som
e gente muita gente
quando não existir o ser que a ela se ligou?
mergulho na memória
há retalhos de mim por tantos lados
parecem vidas distintas
pequenos excertos
aqui ali acolá
com pétalas e cardos
consoante Deus estava mais ou menos lá
por aí disperso
apenas o núcleo de referência
me tem mantido uno
e fiel a um caminhar principal
o tempo será quem faz o resto
não fico em lado nenhum porque ninguém fica
irei não sei bem onde porque ninguém sabe
mas sei que terei que ir para qualquer lado
que será da memória toda
que é luz e vida e som
e gente muita gente
quando não existir o ser que a ela se ligou?
Curitiba meu amor

na minha nau
num mar de tempestades
medonho o vento
feroz a vaga
meu coração será a chama
a coragem necessária
e como estás aí
sonho atlântico
ninfa doce celestial
tua voz quente e tropical
me guiará
serei teu descobridor
tu alguém no Paraná por descobrir
e entre Curitiba e Lisboa
todo o sentido das coisas
o amor a saudade e a distância
nau e sonho
longe e perto
Curitiba meu amor
eu te prometo
que estarei sempre a chegar
num mar de tempestades
medonho o vento
feroz a vaga
meu coração será a chama
a coragem necessária
e como estás aí
sonho atlântico
ninfa doce celestial
tua voz quente e tropical
me guiará
serei teu descobridor
tu alguém no Paraná por descobrir
e entre Curitiba e Lisboa
todo o sentido das coisas
o amor a saudade e a distância
nau e sonho
longe e perto
Curitiba meu amor
eu te prometo
que estarei sempre a chegar
quinta-feira, novembro 24, 2005
acomodados
tenho sopa tacho e guardanapos
não me divirto nem amo e ando triste
fico porque não quero correr riscos
tenho a cabeça feita para não variar nada
o cão da rua vê-me passar
e como cão velho que é e experiente
conhece-me por dentro e por fora
o meu silêncio
o meu passar quase transparente
o esforço que faço
o intervalo que sou entre dois nadas
também o conheço a ele
almas gémeas de um mundo semelhante
em que mais vale comer e calar
do que ladrar
quem ladra mais é quem tem mais língua
e mais galões
"manda quem pode obedece quem teme"
eu e aquele cão não passamos de dois reflexos
a quem as donas retiraram os sexos
somos dois enfeites para elas
conformados
querem-nos para não fazermos nada
nós habituamo-nos
dormimos roncamos
e ao menos assim
nem ele leva tareia
nem a mim me falta a sopa
não me divirto nem amo e ando triste
fico porque não quero correr riscos
tenho a cabeça feita para não variar nada
o cão da rua vê-me passar
e como cão velho que é e experiente
conhece-me por dentro e por fora
o meu silêncio
o meu passar quase transparente
o esforço que faço
o intervalo que sou entre dois nadas
também o conheço a ele
almas gémeas de um mundo semelhante
em que mais vale comer e calar
do que ladrar
quem ladra mais é quem tem mais língua
e mais galões
"manda quem pode obedece quem teme"
eu e aquele cão não passamos de dois reflexos
a quem as donas retiraram os sexos
somos dois enfeites para elas
conformados
querem-nos para não fazermos nada
nós habituamo-nos
dormimos roncamos
e ao menos assim
nem ele leva tareia
nem a mim me falta a sopa
pedacinho de ti
entre o top que usavas e a sainha
vi um dia
um pedacinho de ti
que não mais esqueci
falavas
eu tentava acompanhar
a voz e o gesto
num esforço visível
incapaz de me concentrar
ouvia como podia
seguia o teu olhar
baixava e levantava os sentidos
sem conseguir atinar
céus que impaciência
que maneira de sentir
que forma de desejar
quem sente assim
quem deseja assim
só pode achar o resto escasso
e a sua existência nada
era como estar no escuro
e espreitar por um qualquer furo
toda a luz
um pedacinho de ti
alvo e breve
com todo o sabor a mel
a doce
e a sal
compreendi ali
que espreitar não é o mesmo que agarrar
até o leão sabe isso
em abraço mortal
agarra a presa boa
e fica nela
porque ele sabe que a presa foge
e se não lutar por ela
qualquer outro caçador
a vai caçar
vi um dia
um pedacinho de ti
que não mais esqueci
falavas
eu tentava acompanhar
a voz e o gesto
num esforço visível
incapaz de me concentrar
ouvia como podia
seguia o teu olhar
baixava e levantava os sentidos
sem conseguir atinar
céus que impaciência
que maneira de sentir
que forma de desejar
quem sente assim
quem deseja assim
só pode achar o resto escasso
e a sua existência nada
era como estar no escuro
e espreitar por um qualquer furo
toda a luz
um pedacinho de ti
alvo e breve
com todo o sabor a mel
a doce
e a sal
compreendi ali
que espreitar não é o mesmo que agarrar
até o leão sabe isso
em abraço mortal
agarra a presa boa
e fica nela
porque ele sabe que a presa foge
e se não lutar por ela
qualquer outro caçador
a vai caçar
sempre o adeus

habituei-me a vê-las
mãos a acenar
ficava a contemplar os carros na estrada internacional
e por entre o desolado da paisagem
o futuro agreste
os meus olhos entusiasmados sorriam
mas o meu peito de menino sofria
porque a gente que me via e que eu via
era gente que passava
e que não mais veria
no caminho velho
ouvia-se um gemido de carro de bois
trepava a encosta
e soava uma voz campestre
que berrava assim
"ah qui à macho
anda mula"
percebia o contraste que via
então voltava o rosto e corria
como navegador sem idade
para fazer um mar na estrada asfaltada
construir um barco e largar
habituei-me a viver perdido na distância
num lugar pequeno mas cheio de horizonte
e punha como podia o meu coração no mundo
o melhor de mim está aí
quando digo adeus e quero embarcar
quando fico e não vou
quando vou e tenho de ficar
amo mais todos na vertigem da passagem
hoje em Lisboa sinto o mesmo que senti na Beira
berço rude
estrada internacional asfaltada
digo adeus a alguém que não é português
choro num fado da Amália com guitarras
mãos a acenar
ficava a contemplar os carros na estrada internacional
e por entre o desolado da paisagem
o futuro agreste
os meus olhos entusiasmados sorriam
mas o meu peito de menino sofria
porque a gente que me via e que eu via
era gente que passava
e que não mais veria
no caminho velho
ouvia-se um gemido de carro de bois
trepava a encosta
e soava uma voz campestre
que berrava assim
"ah qui à macho
anda mula"
percebia o contraste que via
então voltava o rosto e corria
como navegador sem idade
para fazer um mar na estrada asfaltada
construir um barco e largar
habituei-me a viver perdido na distância
num lugar pequeno mas cheio de horizonte
e punha como podia o meu coração no mundo
o melhor de mim está aí
quando digo adeus e quero embarcar
quando fico e não vou
quando vou e tenho de ficar
amo mais todos na vertigem da passagem
hoje em Lisboa sinto o mesmo que senti na Beira
berço rude
estrada internacional asfaltada
digo adeus a alguém que não é português
choro num fado da Amália com guitarras
regresso sem futuro
as nuvens baixam no inverno
estreita-se o cerco entre a terra e o céu
em frio intenso e terra agreste
não há idade para manter a lareira acesa
o gato mia sobre pedras centenares
parece vazia a casa antiga
que foi grada e teve voz
no fundo da ravina
o ribeiro vai correndo
o murmúrio é o mesmo outras as águas
também na capelinha do monte
há mãos rezando
o mesmo fervor outras as mãos
detenho o olhar no caminho desolado
coberto de silvas e de giestas
outrora formigueiro de gente e de algazarra
que levava à sementeira
seco por dentro e por fora
ponho a cara na distância
e parto sem olhar para trás como fazia dantes
nunca senti tanto
tanta falta de futuro
estreita-se o cerco entre a terra e o céu
em frio intenso e terra agreste
não há idade para manter a lareira acesa
o gato mia sobre pedras centenares
parece vazia a casa antiga
que foi grada e teve voz
no fundo da ravina
o ribeiro vai correndo
o murmúrio é o mesmo outras as águas
também na capelinha do monte
há mãos rezando
o mesmo fervor outras as mãos
detenho o olhar no caminho desolado
coberto de silvas e de giestas
outrora formigueiro de gente e de algazarra
que levava à sementeira
seco por dentro e por fora
ponho a cara na distância
e parto sem olhar para trás como fazia dantes
nunca senti tanto
tanta falta de futuro
tão perto
nunca os teus olhos me pareceram tão claros
nunca te tinha visto tão perto
nunca estive tão próximo do princípio e do fim
nunca desejei tanto a expressão do teu rosto
nunca estive tanto tempo dentro de ti
deixando-me ir
segurando-te o corpo
colando um beijo nos teus lábios doces
na lágrima pequenina
no mel dos teus sentidos
nunca me apeteceu tanto viver e morrer
ficar ou ir contigo para sempre
nunca te tinha visto tão perto
nunca estive tão próximo do princípio e do fim
nunca desejei tanto a expressão do teu rosto
nunca estive tanto tempo dentro de ti
deixando-me ir
segurando-te o corpo
colando um beijo nos teus lábios doces
na lágrima pequenina
no mel dos teus sentidos
nunca me apeteceu tanto viver e morrer
ficar ou ir contigo para sempre
guerra de audiências

à hora do jantar na televisão
passavam os horrores mais perversos
deste mundo cão
casos de guerra arrepiantes
gente sem nada
nem abrigo nem pão nem água
pessoas atacadas queimadas
mutiladas com ácido sulfúrico
uma grávida violada
um desfilar de tanto mal que ultrapassava quase a ficção
e a minúcia era tal
que o choque e o nojo do que via
me tirou o apetite do bacalhau com grão de bico que comia
cansado de tão perverso realismo
desci os olhos ecrã abaixo
vexado envergonhado
tentando fugir naturalmente daquilo
quando saía
não deixei de ver em rodapé
um anúncio ilustrado de um próximo programa
na mesma televisão
que mostrava gajas e gajos em cuecas
uma piscina
a antevisão de um requintadíssimo deboche
fez-se um intervalo para publicidade
eu desliguei aquela máquina bizarra
quando já desfilava um anúncio que mostrava
neve
pai natal
e um combóio resplandescente
transbordando de brinquedos
fui dar uma volta pela noite fria de Dezembro
pensei muito no Menino Jesus
passavam os horrores mais perversos
deste mundo cão
casos de guerra arrepiantes
gente sem nada
nem abrigo nem pão nem água
pessoas atacadas queimadas
mutiladas com ácido sulfúrico
uma grávida violada
um desfilar de tanto mal que ultrapassava quase a ficção
e a minúcia era tal
que o choque e o nojo do que via
me tirou o apetite do bacalhau com grão de bico que comia
cansado de tão perverso realismo
desci os olhos ecrã abaixo
vexado envergonhado
tentando fugir naturalmente daquilo
quando saía
não deixei de ver em rodapé
um anúncio ilustrado de um próximo programa
na mesma televisão
que mostrava gajas e gajos em cuecas
uma piscina
a antevisão de um requintadíssimo deboche
fez-se um intervalo para publicidade
eu desliguei aquela máquina bizarra
quando já desfilava um anúncio que mostrava
neve
pai natal
e um combóio resplandescente
transbordando de brinquedos
fui dar uma volta pela noite fria de Dezembro
pensei muito no Menino Jesus
contemplando
olhava as ondas rebentar contra os rochedos
os meus olhos abrangiam a costa toda até deixar de se ver
imenso era o céu em cima
que emprestava silêncio ao barulho do mar
numa espécie de promontório
tentava esticar os sentidos para lá do que se via
sempre na ânsia de poder ver mais
e talvez no engodo de que algo de belo pudesse acontecer
punha-me em bicos de pés
quase caía
esquecia tudo
mas nunca acontecia nada
o mar é mar e o céu é céu
o promontório é apenas um conjunto de pedras grandes
e se há deusas no mar
sereias
ondas de prata a envolverem anjos
nunca as vi
a coisa maior que me ocorre sempre
quando faço isto e me ponho a olhar o mar
(que encobre até um certo desencanto)
é a memória do Infante
e do que ele deve ter visto e sonhado
entre medos e nevoeiros cerrados
olhando este infinito mar
depois mundo português
os meus olhos abrangiam a costa toda até deixar de se ver
imenso era o céu em cima
que emprestava silêncio ao barulho do mar
numa espécie de promontório
tentava esticar os sentidos para lá do que se via
sempre na ânsia de poder ver mais
e talvez no engodo de que algo de belo pudesse acontecer
punha-me em bicos de pés
quase caía
esquecia tudo
mas nunca acontecia nada
o mar é mar e o céu é céu
o promontório é apenas um conjunto de pedras grandes
e se há deusas no mar
sereias
ondas de prata a envolverem anjos
nunca as vi
a coisa maior que me ocorre sempre
quando faço isto e me ponho a olhar o mar
(que encobre até um certo desencanto)
é a memória do Infante
e do que ele deve ter visto e sonhado
entre medos e nevoeiros cerrados
olhando este infinito mar
depois mundo português
adorável anna kournikova

se fosse fácil
se tudo se cumprisse assim
num estalar de dedos
como eu quisesse
se nem precisasse de falar e tu aparecesses
se pudesse pedir-te um momento apenas
dos teus momentos tantos
sonhados
apetecidos
imaginados
se fosse fácil
sentir-te perto
o movimento
o sorriso aberto
o jeito simples
sei que bastaria
para que a magia acontecesse
como nos contos de fadas
só que nos contos de fadas o tempo escapa
e os personagens são bonitos de mais porque não são verdade
contigo queria que não fosse assim
queria que existisses mesmo
e que o momento que me desses ficasse suspenso no tempo
deliciosamente eterno
deveria Deus fazer o milagre da unicidade
para continuares única
e em simultâneo
tornar-te omnipresente
para que pudesses ser também só e de cada um
porque és linda demais para não se dar conta
porque é uma perda seres tão pouco para tamanho amor universal
porque a luz que tens é bem do tamanho das estrelas todas
porque para lá de ti não existe sonho
se tudo se cumprisse assim
num estalar de dedos
como eu quisesse
se nem precisasse de falar e tu aparecesses
se pudesse pedir-te um momento apenas
dos teus momentos tantos
sonhados
apetecidos
imaginados
se fosse fácil
sentir-te perto
o movimento
o sorriso aberto
o jeito simples
sei que bastaria
para que a magia acontecesse
como nos contos de fadas
só que nos contos de fadas o tempo escapa
e os personagens são bonitos de mais porque não são verdade
contigo queria que não fosse assim
queria que existisses mesmo
e que o momento que me desses ficasse suspenso no tempo
deliciosamente eterno
deveria Deus fazer o milagre da unicidade
para continuares única
e em simultâneo
tornar-te omnipresente
para que pudesses ser também só e de cada um
porque és linda demais para não se dar conta
porque é uma perda seres tão pouco para tamanho amor universal
porque a luz que tens é bem do tamanho das estrelas todas
porque para lá de ti não existe sonho
assunto sério em meia rima
a inocência de Filipa
não era o que parecia
porque ela ouvia ouvia
mas ninguém levava nada
tinha sempre uma maneira
de afastar os mirones
fingia não perceber
ou percebia fingindo
o patrão ficou difícil
fazia chantagem com ela
mesmo assim já resistia
há quatro meses de assédio
Filipa não tinha culpa
de ter o corpo que tinha
pois lá dentro era ainda
uma ninfa uma anjinha
o que apetecia a outras
a ela não apetecia
não tinha ainda maldade
por isso se defendia
até que um dia de Agosto
a loja estava vazia
o patrão andava louco
só ela lhe apetecia
fechou a porta da rua
encontrou-a no armazém
as intenções que trazia
não enganavam ninguém
chegou-se aonde ela estava
as roupas curtas e leves
depressa ele as rasgava
com toda a força que tinha
na cara dela estampou-se
a raiva o ódio o nojo
lutou berrou mas cedeu
nas garras de Varatojo
ficava ali a inocência
a violação consumada
algum sangue da ocorrência
a lei da selva provada
não era o que parecia
porque ela ouvia ouvia
mas ninguém levava nada
tinha sempre uma maneira
de afastar os mirones
fingia não perceber
ou percebia fingindo
o patrão ficou difícil
fazia chantagem com ela
mesmo assim já resistia
há quatro meses de assédio
Filipa não tinha culpa
de ter o corpo que tinha
pois lá dentro era ainda
uma ninfa uma anjinha
o que apetecia a outras
a ela não apetecia
não tinha ainda maldade
por isso se defendia
até que um dia de Agosto
a loja estava vazia
o patrão andava louco
só ela lhe apetecia
fechou a porta da rua
encontrou-a no armazém
as intenções que trazia
não enganavam ninguém
chegou-se aonde ela estava
as roupas curtas e leves
depressa ele as rasgava
com toda a força que tinha
na cara dela estampou-se
a raiva o ódio o nojo
lutou berrou mas cedeu
nas garras de Varatojo
ficava ali a inocência
a violação consumada
algum sangue da ocorrência
a lei da selva provada
quase indiferente
absorto
num sítio que não conheço
não me sinto de acordo
nem de bem comigo
as vozes que ouço
o movimento que mexe
ainda mais me entristecem
não me sinto dentro
nem fora do ambiente
num sítio que não conheço
não me sinto de acordo
nem de bem comigo
as vozes que ouço
o movimento que mexe
ainda mais me entristecem
não me sinto dentro
nem fora do ambiente
abraço envolvente
o meu desconforto
os meus nadas
contigo os transformava
em coisas boas
bastava que estivesses ali
e arquitectei a ideia tola
de te ter quando quisesse
quando o vazio apertasse
serias a reserva para lá do nada
o lameiro de pasto cheio
quando a seca fosse cruel
e ameaçasse morte
serias a espiga grada
quando me apetecesse colher
e sentir o fruto bom que a vida é
estarias na terra para lá de tudo
até mesmo para lá de mim
serias sol luz e horizonte
do meu cimento
do vegetar repetido
dos dias sem sentido
das noites longas
e tu lá estarias sempre
no final do pesadelo
oceano fantasia
lugar cativo
abraço envolvente
quente quente
que havia de ser tão real
quanto a minha imaginação quisesse que fosse
os meus nadas
contigo os transformava
em coisas boas
bastava que estivesses ali
e arquitectei a ideia tola
de te ter quando quisesse
quando o vazio apertasse
serias a reserva para lá do nada
o lameiro de pasto cheio
quando a seca fosse cruel
e ameaçasse morte
serias a espiga grada
quando me apetecesse colher
e sentir o fruto bom que a vida é
estarias na terra para lá de tudo
até mesmo para lá de mim
serias sol luz e horizonte
do meu cimento
do vegetar repetido
dos dias sem sentido
das noites longas
e tu lá estarias sempre
no final do pesadelo
oceano fantasia
lugar cativo
abraço envolvente
quente quente
que havia de ser tão real
quanto a minha imaginação quisesse que fosse
esperar
perturba o tempo grande que não passa
mesmo sabendo que a corrida é curta
esperar é terrível
cansa mais esperar muito do que andar muito
talvez se sinta mais o medo de ter medo
a fobia do espaço e do vazio
talvez se tenha medo de sofrer
porque perto vemos mais as maleitas dos outros
e também as nossas
estar bem onde se está não é nada fácil
sobretudo se se está parado
à espera não se sabe bem de quê
e se tem consciência disso
mesmo sabendo que a corrida é curta
esperar é terrível
cansa mais esperar muito do que andar muito
talvez se sinta mais o medo de ter medo
a fobia do espaço e do vazio
talvez se tenha medo de sofrer
porque perto vemos mais as maleitas dos outros
e também as nossas
estar bem onde se está não é nada fácil
sobretudo se se está parado
à espera não se sabe bem de quê
e se tem consciência disso
diminuir abismos
é mágico para a criança
que brinca no riacho
subir o fio de água aos solavancos
chegar à ponte e atingir a outra margem
há um riso de vitória quase sempre
um acenar de braços
triunfante
porque a criança sabe o que a ponte vale
e a alegria que é
dominar o precipício
vencer o isolamento
poder juntar-se aos meninos do lado de lá
e brincar com eles
que bom seria
que os adultos percebessem isto
e fizessem pontes
muitas pontes
para diminuir abismos
espalhar sorrisos
e aproximar abraços
que brinca no riacho
subir o fio de água aos solavancos
chegar à ponte e atingir a outra margem
há um riso de vitória quase sempre
um acenar de braços
triunfante
porque a criança sabe o que a ponte vale
e a alegria que é
dominar o precipício
vencer o isolamento
poder juntar-se aos meninos do lado de lá
e brincar com eles
que bom seria
que os adultos percebessem isto
e fizessem pontes
muitas pontes
para diminuir abismos
espalhar sorrisos
e aproximar abraços
quarta-feira, novembro 23, 2005
algures num canto da cidade
quando se deixa a via larga em roncos de motores
velocidade estonteante
entre torres de cimento a perder de vista
já mesmo na curvatura onde os carros somem para baixo
um velhinho pede esmola aproveitando os semáforos
se mais nada houvesse para dizer
se outra importância não tivesse
aquela presença humana
bastaria o contraste que ressalta
olhando para ele e para os outros
para valer a pena estar ali
de um lado
uma fragilidade autêntica
envolta em farrapos que a vida lhe deu
um sorriso que ainda existe para agradar aos outros
a alguém que se interesse por ele
e não o deixe morrer
do outro
vultos empertigados sem expressão no rosto
nem em sítio nenhum
sem olhos para ver
nem coração para sentir uma situação humana
mais parecem mortos estes vivos que passam
se calhar nem eles sabem porque ficaram assim
velocidade estonteante
entre torres de cimento a perder de vista
já mesmo na curvatura onde os carros somem para baixo
um velhinho pede esmola aproveitando os semáforos
se mais nada houvesse para dizer
se outra importância não tivesse
aquela presença humana
bastaria o contraste que ressalta
olhando para ele e para os outros
para valer a pena estar ali
de um lado
uma fragilidade autêntica
envolta em farrapos que a vida lhe deu
um sorriso que ainda existe para agradar aos outros
a alguém que se interesse por ele
e não o deixe morrer
do outro
vultos empertigados sem expressão no rosto
nem em sítio nenhum
sem olhos para ver
nem coração para sentir uma situação humana
mais parecem mortos estes vivos que passam
se calhar nem eles sabem porque ficaram assim
no rio da minha terra
deitado no leito do rio que corria
guardava bem dentro de mim
o barulho bom das águas em cascata
ao meu lado
um lençol de natureza
misturava pedras
com erva
com arbustos
com perfumes da terra
deixei-me estar
parecia que as águas em cascata
vertiam dentro de mim
fios de água reluzentes raiando em sol de prata
senti-me oco
como se apenas tivesse
uma casca moldando o corpo
abandonei-me completamente
ao silêncio de sons pequenos e campestres
que pura e cristalina era a água que corria
que prazer total sentia
imaginando uma lavagem visceral
todo o meu ser sacudia
a pouco e pouco
o cansaço urbano
a coisa má que nos tira o sono
e o resto
cem anos que eu viva
nunca esquecerei o rio da minha terra
e o bem que faz
quando gostamos dele
e temos dentro de nós
espaço mental para estarmos só ao pé dele
guardava bem dentro de mim
o barulho bom das águas em cascata
ao meu lado
um lençol de natureza
misturava pedras
com erva
com arbustos
com perfumes da terra
deixei-me estar
parecia que as águas em cascata
vertiam dentro de mim
fios de água reluzentes raiando em sol de prata
senti-me oco
como se apenas tivesse
uma casca moldando o corpo
abandonei-me completamente
ao silêncio de sons pequenos e campestres
que pura e cristalina era a água que corria
que prazer total sentia
imaginando uma lavagem visceral
todo o meu ser sacudia
a pouco e pouco
o cansaço urbano
a coisa má que nos tira o sono
e o resto
cem anos que eu viva
nunca esquecerei o rio da minha terra
e o bem que faz
quando gostamos dele
e temos dentro de nós
espaço mental para estarmos só ao pé dele
nevava
nevava muito na terra da minha infância
o branco e o frio
o chão escorregadio
a água por correr
o telhado
com gelo pendurado
que piada que eu achava
que descoberta que aquilo tudo era
até na escada de fora
vidrada
gelada
a queda dada sabia bem
tudo se fazia sem pensar em nada
não era importante não haver água
o importante era a novidade da torneira
gelada
a queda dada que fazia rir
o branco e o frio
o chão escorregadio
a água por correr
o telhado
com gelo pendurado
que piada que eu achava
que descoberta que aquilo tudo era
até na escada de fora
vidrada
gelada
a queda dada sabia bem
tudo se fazia sem pensar em nada
não era importante não haver água
o importante era a novidade da torneira
gelada
a queda dada que fazia rir
terça-feira, novembro 22, 2005
desistir
não dá fugir da barafunda
dos enredos
das ruas apertadas
apinhadas
das coisas por fazer
das incapacidades globais
das angústias de não sermos capazes
dos movimentos instintivos
repetidos
que não dependem só de nós
não dá sair pelas traseiras
e dizer adeus à rua principal
não dá ficar no tempo de outro tempo
num qualquer lugarejo sem presente
não dá fugir do medo
porque ele corre atrás de nós
não dá ficarmos a falar sozinhos
ou simplesmente fecharmos os olhos
porque
pode não gostar do que se vê
mas o melhor é ver
pode não se gostar do que se tem
mas o melhor é ter
pode até não ser fácil evitar fugir
mas sentir medo e fugir por isso
só por isso
cuidado
que o tiro pode sair pela culatra
e na esperança de um conforto
pode suceder
que nunca mais tenhamos paz
dos enredos
das ruas apertadas
apinhadas
das coisas por fazer
das incapacidades globais
das angústias de não sermos capazes
dos movimentos instintivos
repetidos
que não dependem só de nós
não dá sair pelas traseiras
e dizer adeus à rua principal
não dá ficar no tempo de outro tempo
num qualquer lugarejo sem presente
não dá fugir do medo
porque ele corre atrás de nós
não dá ficarmos a falar sozinhos
ou simplesmente fecharmos os olhos
porque
pode não gostar do que se vê
mas o melhor é ver
pode não se gostar do que se tem
mas o melhor é ter
pode até não ser fácil evitar fugir
mas sentir medo e fugir por isso
só por isso
cuidado
que o tiro pode sair pela culatra
e na esperança de um conforto
pode suceder
que nunca mais tenhamos paz
sentir Portugal
não consigo fazer o caminho de França
sem sentir um arrepio
mais quando vou
e fica para trás a distância
e um país
um povo e um destino
um fatalismo necessário
sentir Portugal ali
é sentir nau aldeia mar
uma tristeza imensa
também raiva e dor
uma vontade de chorar
porque acho que nascemos para ser maiores
como não somos
e temos que atravessar a Espanha
depois a França até Paris
há grandeza e pequenez que se confundem
há nobreza e singeleza em cada olhar
há um grito obrigatório dentro de cada português
depois a inconstância de algo por achar
um desejo de ser e de não ser
uma amálgama de amor e desamor que se confundem
o caminho de França é onde Portugal melhor se encontra
bastava isso para eu gostar dele
Portugal feito de sonhos
e de feitos
de sítios andados
encontrados
e de gente que vale tanto
e é tão grande
que fez de um espaço pequeno
tantas vezes esquecido
uma odisseia que tem bem o tamanho do mundo
sem sentir um arrepio
mais quando vou
e fica para trás a distância
e um país
um povo e um destino
um fatalismo necessário
sentir Portugal ali
é sentir nau aldeia mar
uma tristeza imensa
também raiva e dor
uma vontade de chorar
porque acho que nascemos para ser maiores
como não somos
e temos que atravessar a Espanha
depois a França até Paris
há grandeza e pequenez que se confundem
há nobreza e singeleza em cada olhar
há um grito obrigatório dentro de cada português
depois a inconstância de algo por achar
um desejo de ser e de não ser
uma amálgama de amor e desamor que se confundem
o caminho de França é onde Portugal melhor se encontra
bastava isso para eu gostar dele
Portugal feito de sonhos
e de feitos
de sítios andados
encontrados
e de gente que vale tanto
e é tão grande
que fez de um espaço pequeno
tantas vezes esquecido
uma odisseia que tem bem o tamanho do mundo
silêncio e esperança
o vento às vezes solta o norte
sinto um arrepio
é tanta coisa que ele me traz
que fico a pensar
na janela em Lisboa escancarada
se aquela lufada de ar prenhe de tudo
gente
recordações
imagens
palavras
lugares
se tudo apenas valeu o que valeu
teve o sabor que teve e mais nenhum
se quando eu fechar esta janela
e virar silêncio
pequenez
nada
quando já não ouvir o silvo do vento
nem sentir a minha fonte
onde ficará tudo o que existiu comigo?
esse espaço imenso
único
a semente o fruto o esplendor o sofrimento
o espaço ocupado com os passos e com a ideia
vivido
tantas vezes transformado
virará vazio assim sem mais nem menos
como um simples fechar de uma janela?
no mínimo
acharia um enorme desperdício
e custa-me a crer
que Deus nos fizesse uma coisa dessas
sinto um arrepio
é tanta coisa que ele me traz
que fico a pensar
na janela em Lisboa escancarada
se aquela lufada de ar prenhe de tudo
gente
recordações
imagens
palavras
lugares
se tudo apenas valeu o que valeu
teve o sabor que teve e mais nenhum
se quando eu fechar esta janela
e virar silêncio
pequenez
nada
quando já não ouvir o silvo do vento
nem sentir a minha fonte
onde ficará tudo o que existiu comigo?
esse espaço imenso
único
a semente o fruto o esplendor o sofrimento
o espaço ocupado com os passos e com a ideia
vivido
tantas vezes transformado
virará vazio assim sem mais nem menos
como um simples fechar de uma janela?
no mínimo
acharia um enorme desperdício
e custa-me a crer
que Deus nos fizesse uma coisa dessas
dançávamos pela noitinha

dançávamos pela noitinha
a música ecoava sons languidos
de guitarras
vozes tão acertadinhas
que eu e ela e a música
formávamos um único sentimento
tão forte
tão intenso
que não era preciso fazer nada
para que o corpo e o resto ganhassem movimento
o vestido dela era de uma seda fina
macio
com um colorido de matizes
que tinham mais calor que o próprio Sol
as suas mãos tremiam com impulsos pequeninos
nas minhas
não era preciso dar beijos
nem abrir os olhos
ou soltar uma lágrima
tudo acontecia sem se dar conta
porque a alma estava toda ali
e emprestava à festa
uma elevação tal
que tudo se confundia
de tão perfeito que era
a música ecoava sons languidos
de guitarras
vozes tão acertadinhas
que eu e ela e a música
formávamos um único sentimento
tão forte
tão intenso
que não era preciso fazer nada
para que o corpo e o resto ganhassem movimento
o vestido dela era de uma seda fina
macio
com um colorido de matizes
que tinham mais calor que o próprio Sol
as suas mãos tremiam com impulsos pequeninos
nas minhas
não era preciso dar beijos
nem abrir os olhos
ou soltar uma lágrima
tudo acontecia sem se dar conta
porque a alma estava toda ali
e emprestava à festa
uma elevação tal
que tudo se confundia
de tão perfeito que era
em Agosto ao luar

tinha chovido e era Agosto
pequenas gotículas de chuva
nas folhas largas das parreiras
davam viço
e sabor a lábios de mulher
também a mosto
a passagem era verdejante
com erva por cortar
e a latada em túnel
fazia entre nós e o luar
um tecto tão baixinho
que quase o tocávamos
com a alegria e o saltitar tão naturais
ao fundo a figueira larga sobressaía na clareira
grande estática envolvente
aconchego de bandos de pardais
abrigo de homens e mulheres do campo
lembrava um manto gigante
que depois foi leito chão e flor
e por um tempo teve som
falou gemeu chorou
cantou
e por ser tanto o amor
e tão pouco o tempo
ali ficou
com lágrimas de impossíveis
uma recordação
tão linda
tão fugaz
que durará sempre
pequenas gotículas de chuva
nas folhas largas das parreiras
davam viço
e sabor a lábios de mulher
também a mosto
a passagem era verdejante
com erva por cortar
e a latada em túnel
fazia entre nós e o luar
um tecto tão baixinho
que quase o tocávamos
com a alegria e o saltitar tão naturais
ao fundo a figueira larga sobressaía na clareira
grande estática envolvente
aconchego de bandos de pardais
abrigo de homens e mulheres do campo
lembrava um manto gigante
que depois foi leito chão e flor
e por um tempo teve som
falou gemeu chorou
cantou
e por ser tanto o amor
e tão pouco o tempo
ali ficou
com lágrimas de impossíveis
uma recordação
tão linda
tão fugaz
que durará sempre
segunda-feira, novembro 21, 2005
beleza e ironia
quantos homens te desejam
mulher inexplicavelmente bela
quando passeias roupa apertadinha
no passeio da praia à tardinha
e o que mais me dana
é saber que tu sentes tal desejo
com o jeito de quem emana
um turbilhão de ideias tontas
nos olhares que só de os ver te vejo
que pintura que és de cores tão quentes
tão pitoresca e leve que incendeias
corações fracos às vezes gastos
tal é o calor que tens e que semeias
por seres incrivelmente linda
e teres formas tão pefeitas
chego a pensar que alguém como tu devia
ser para o Estado fonte de receita
por exemplo como um monumento
pagar para te ver e fotografar
ou então seres Presidente
porque não(?)
era ver o povo doido de contente
e incendiar de contentamento a nação
mulher inexplicavelmente bela
quando passeias roupa apertadinha
no passeio da praia à tardinha
e o que mais me dana
é saber que tu sentes tal desejo
com o jeito de quem emana
um turbilhão de ideias tontas
nos olhares que só de os ver te vejo
que pintura que és de cores tão quentes
tão pitoresca e leve que incendeias
corações fracos às vezes gastos
tal é o calor que tens e que semeias
por seres incrivelmente linda
e teres formas tão pefeitas
chego a pensar que alguém como tu devia
ser para o Estado fonte de receita
por exemplo como um monumento
pagar para te ver e fotografar
ou então seres Presidente
porque não(?)
era ver o povo doido de contente
e incendiar de contentamento a nação
criação divina

se soubesses a ternura que o teu corpo encerra
o desejo o querer e também o amor que inspira
criou-te Deus tenho a certeza
num dia em que tinha a inspiração toda
tal como a cria que ontem vi nascer
vê só de uma mãe búfalo
em plena pradaria e sem parteira
ela pôs-se de pé ali de olhos abertos
e começou a correr
ao pé dos outros todos
a encantá-los a todos com a energia de quem nasce
e ver essa cria é ver-te a ti
força ternura transcendente
que basta estar mexer saltar sorrir
que o nosso coração não pára de bater
querer-te a ti é querer a Deus
sem blasfémia
porque Ele fez-te assim tão bela
para tornar o mundo mais feliz
e a inspiração que teve
ao desenhar-te
o traço firme os tons as cores
a medida certa
só mostra ao mundo que não morreu
e de CRIADOR não perdeu o jeito
uma ova!!!
Ele acaba de criar apenas
ANNA KOURNIKOVA
o desejo o querer e também o amor que inspira
criou-te Deus tenho a certeza
num dia em que tinha a inspiração toda
tal como a cria que ontem vi nascer
vê só de uma mãe búfalo
em plena pradaria e sem parteira
ela pôs-se de pé ali de olhos abertos
e começou a correr
ao pé dos outros todos
a encantá-los a todos com a energia de quem nasce
e ver essa cria é ver-te a ti
força ternura transcendente
que basta estar mexer saltar sorrir
que o nosso coração não pára de bater
querer-te a ti é querer a Deus
sem blasfémia
porque Ele fez-te assim tão bela
para tornar o mundo mais feliz
e a inspiração que teve
ao desenhar-te
o traço firme os tons as cores
a medida certa
só mostra ao mundo que não morreu
e de CRIADOR não perdeu o jeito
uma ova!!!
Ele acaba de criar apenas
ANNA KOURNIKOVA
que vocação(?)
de tudo um pouco tenho feito
sempre tentando acompanhar o movimento
e não ser menos que os outros
ou sentir maior incapacidade no crescer
passeei-me nas memórias dos livros de estudo
nas notas más e menos más
nos jogos de ganhar e de perder
fui ensaiando quase tudo
às vezes levando o meu esforço
aos limites do impossível
tinha tanto jeito em quase tudo
ganhava mais do que perdia
estava sempre em tanto lado
nos sítios onde algo acontecia
mas fazendo bem as contas
ao produto final de tanta dispersão
amigos
que desilusão
foram teclas a mais que eu toquei
castelos no ar que não pousei
e as lutas ficaram por agarrar
passou o Sol surgiu a Lua
dia e noite noite e dia
e hoje sei
que perdi mais do que ganhei
sempre tentando acompanhar o movimento
e não ser menos que os outros
ou sentir maior incapacidade no crescer
passeei-me nas memórias dos livros de estudo
nas notas más e menos más
nos jogos de ganhar e de perder
fui ensaiando quase tudo
às vezes levando o meu esforço
aos limites do impossível
tinha tanto jeito em quase tudo
ganhava mais do que perdia
estava sempre em tanto lado
nos sítios onde algo acontecia
mas fazendo bem as contas
ao produto final de tanta dispersão
amigos
que desilusão
foram teclas a mais que eu toquei
castelos no ar que não pousei
e as lutas ficaram por agarrar
passou o Sol surgiu a Lua
dia e noite noite e dia
e hoje sei
que perdi mais do que ganhei
sempre o sonho
sonha-se muito ainda bem
é o que nos dá largueza grande
o amor é lindo a amizade necessária
há emoção a rodos e ilusão
parece que se anda sempre de barriga cheia
num pomar azul de laranjeiras
há frutos coloridos saborosos
que vêm da semente semeada
imaginada
há primaveras e verões de lua cheia
portões a abrir prazer sem fim
o brilho incandescente no olhar
de toda a gente
oxalá não se passasse nunca a fase da quimera
do tudo é possível
da linha sem fim
oxalá o sonho lindo a amizade pura
jorrassem das alturas como estrelas celestes
multicores
e nos cobrissem de um calor suave
de uma alegria eterna
que nos levassem a um êxtase de ternura
é o que nos dá largueza grande
o amor é lindo a amizade necessária
há emoção a rodos e ilusão
parece que se anda sempre de barriga cheia
num pomar azul de laranjeiras
há frutos coloridos saborosos
que vêm da semente semeada
imaginada
há primaveras e verões de lua cheia
portões a abrir prazer sem fim
o brilho incandescente no olhar
de toda a gente
oxalá não se passasse nunca a fase da quimera
do tudo é possível
da linha sem fim
oxalá o sonho lindo a amizade pura
jorrassem das alturas como estrelas celestes
multicores
e nos cobrissem de um calor suave
de uma alegria eterna
que nos levassem a um êxtase de ternura
autoestrada do sul
olhei para trás
fui ver se via
na estrada um sinal de ti no asfalto
senti silidão na noite fria
lá atrás bem no fundo do medo
nada bulia
e enquanto o coração pulava solto
as lembranças que ocorriam
eram vagas dispersas
como que de mim saíam
retalhos de fobias
sentimentos sem sentido
ilusões de tempos idos
e a noite grande e escura
cobria os fantasmas que apareciam
o sonho tentava matá-los todos
tal era a força que o movia
eras tu jóia de cristal
branca como a luz ao meio dia
que davas forma e sentido
àquela noite fria
ao viajante ali perdido
e ali em plena escuridão
eras tu a única luz que eu via
fui ver se via
na estrada um sinal de ti no asfalto
senti silidão na noite fria
lá atrás bem no fundo do medo
nada bulia
e enquanto o coração pulava solto
as lembranças que ocorriam
eram vagas dispersas
como que de mim saíam
retalhos de fobias
sentimentos sem sentido
ilusões de tempos idos
e a noite grande e escura
cobria os fantasmas que apareciam
o sonho tentava matá-los todos
tal era a força que o movia
eras tu jóia de cristal
branca como a luz ao meio dia
que davas forma e sentido
àquela noite fria
ao viajante ali perdido
e ali em plena escuridão
eras tu a única luz que eu via
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Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...

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