quinta-feira, novembro 24, 2005

acomodados

tenho sopa tacho e guardanapos
não me divirto nem amo e ando triste
fico porque não quero correr riscos
tenho a cabeça feita para não variar nada

o cão da rua vê-me passar
e como cão velho que é e experiente
conhece-me por dentro e por fora
o meu silêncio
o meu passar quase transparente
o esforço que faço
o intervalo que sou entre dois nadas

também o conheço a ele
almas gémeas de um mundo semelhante
em que mais vale comer e calar
do que ladrar

quem ladra mais é quem tem mais língua
e mais galões
"manda quem pode obedece quem teme"
eu e aquele cão não passamos de dois reflexos
a quem as donas retiraram os sexos

somos dois enfeites para elas
conformados
querem-nos para não fazermos nada
nós habituamo-nos
dormimos roncamos
e ao menos assim
nem ele leva tareia
nem a mim me falta a sopa

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