sexta-feira, fevereiro 29, 2008

barreira ultrapassada

Preciso de sentir abstrair
tumulto inquieto que não sabe onde ir
foco luminoso
que só alumia a dificuldade
que enaltece o lado fraco
e o lado forte esmorece

sofre desfalece
faz de uma pessoa grande
um pingo de gente

hábito gravado sempre à beira da desistência

mas sem esperar sem dar por isso
dificuldade barreira hesitação acumuladas
um peito frágil aparece
agradável agradado
começo a sentir pela primeira vez
e não desisto

fico insisto aguento ultrapasso o limite
e pela primeira vez
eu sinto sinto sinto

como quem de repente
sem resistência julgamento
fica feliz liberta
age chora ri
sente a libertação de amar

passa a barreira por ultrapassar

e o semi-qualquer coisa morre ali
o semi-quero
o semi-vou
o semi-sou

fico inteirinho como afinal sou
o meu peito dobra de tamanho
desencolhe cresce
até parece
uma vela inflada de veleiro em vento forte

no hospital


Dor é dor em toda a parte
dói revolta
entristece isola
é como ficar de fora do mundo
dos outros

do riso farra
vinho gargalhada
do burburinho canseiras
dos motivos de sobra
que fervilham lá fora

alternativas lonjuras
os abraços os carinhos
os encontros os caminhos

o espectáculo da vida

sentir dor adoecer
é assim como não ter nada
na esperança do milagre
ou no desespero sem ele

terça-feira, fevereiro 26, 2008

a força que se tem

Medita usando a inspiração
com a atenção posta no ar
a entrar
vai-o levando por todos os sítios interiores
que tu quiseres

podes acompanhar essa atenção
se for melhor
com a concentração do olhar
por onde andares

mistura cores na intenção
e goza a sensação

poderás brincar
fazer de ti um arco-íris
passares de azul a encarnado
de encarnado a amarelinho
entrar na dimensão do puro
do branquinho

paz sossego um estado de quase transparência

podes fazer tudo no teu recanto habitual
no teu sofá
no areal de uma praia qualquer
no verde relva do teu quintal

só precisas de ar de um lugar
e de te concentrar

um dia destes
que estava gelado em frio de Fevereiro
eu por brincadeira experimentei
inspirava acalmava guaches multicores
lápis escolares
rodando desfilando em cores
no meu corpo regalado

quando me quedei no vermelhinho
dentro rubro como brasas de lareira
o frio que sentia
virou fogueira
foi então que percebi a força que existia
na atenção e na intenção

que é o mesmo que dizer
a força que se tem quando se quer

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

intervalo no padrão habitual

Fusão integração desintegração
não sei
talvez apenas um intervalo
no padrão habitual

lugar que é e que não é
que se quer e não se tem
que se quer fazer dele nem se sabe o quê

ai que perfume que dedos
neste estado semi-consciente de prazer

que entrelaçar bordado
no aroma do amor
que brota em todo o lado
disponível frágil dado

é só colher neste pomar de nós
corpos alma gente
que em sentimento nobre
trocam sensação por sensação

era capaz de desenhar cada rosto sem o ver
cada dedo boca umbigo
só de os perceber

amo-vos tanto
neste puxar a vida para onde deve ser

que se me quereis bem como eu vos quero
mesmo sem mim
fazei florir este jardim
e levai-o sem demora
aonde se sofre e se mata
a toda a hora

segunda-feira, fevereiro 18, 2008

eu não compreendo e fico fraco

Porque não tenho sono acendo o televisor
é noticiado um caso de corrupção
celebridade muita pouca a honestidade
a justiça parece que sim parece que não
eu não compreendo e fico fraco

a seguir vem um imbróglio do caraças
também gente conhecida
crianças violadas pedofilia
ameaças
a justiça parece que sim parece que não
eu não compreendo e fico fraco

depois é um bombista suicida no Iraque
mortos choro confusão por todo o lado
bons e maus a matar até fartar
a justiça parece que sim parece que não
eu não compreendo e fico fraco

desisto mais adiante num assassinato detalhado
candidato que já foi presidente assassinado
perigo nuclear naquele lugar
ruas confusas um arrepio de ambiente
a justiça parece que sim parece que não
eu não compreendo e fico fraco

o sono não vem e eu não me sinto nada bem

vou então à farmácia de serviço mais à mão
e se para alguma coisa as notícias da televisão
vieram a calhar
foi para me avisar
que o meu estado fraco enfraquecera ainda mais
e que para aliviar o mal estar
teria de comprar medicamentos
para me aguentar

porque senhoras e senhores
meninas e meninos
se insónia é mau
insónia com noticiário é dose cavalar

um lugar meu

Um lugar feminino meu
sorriso alegre liso
feno crescido por cortar
tacto de aromas detalhes de infinito
a correr a fugir até cansar
depois parar
cair para se agarrar

o silvo do vento e o canto dos pássaros
tornam tudo mais romântico
misturam suores
gestos imprecisos
no desalinho de roupas risos
sim's não's
avanços recuos preciosos
delicados
braços pernas lutando ansiosos

depois é o sol a espreitar pela clareira
entre as folhas da árvore frondosa

lá em cima os beijos das folhas
tocando-se no sopro do vento
cá em baixo
os meus beijos os teus beijos

inesquecível pedaço de relva
chão da minha Beira
que não mais esqueci

porque aprendi ali debaixo da figueira
a razão maior para estar vivo
e andar aqui

domingo, fevereiro 17, 2008

corpo sentidos do meu ser

Uma vida quase inteira lá fora
no exterior de mim
na beleza na força dos outros
sem quase nunca estar aqui

quando foi que me esqueci
de parar
de me dar conta do meu jeito
do meu corpo
do meu afecto ímpar
do mexer e remexer perfeitos
na funcionalidade de todos os orgãos
de todos os sentidos?

quando deixei de acreditar em mim
para pautar o meu desencanto
pelo imaginado encanto dos outros?

quando assumi só para mim dificuldades
carências incompreensão
em tantas as idades?

desculpa corpo companheiro
o que te fiz
pôr-te assim em segundo plano
desculpem meus sentidos perfeitos
por tantas vezes não estar aqui
que nem percebi a vossa perfeição

hoje ao menos entendi
orgãos corpo sentidos do meu ser
que é a vocês que devo o estar aqui
desde que fui concebido parido
pelo ventre de minha mãe

terça-feira, fevereiro 12, 2008

o menino de mim

Oferece-me o colo embalo suave dedicado
seguro
que eu sinta a força da tua mão frágil
macia
pousada enternecida e dada
no meu corpo cansado

olha por mim
rosa flor todos os cheiros e sabores
preciso tanto do teu beijo
terno quente aconchegado
da fofura envergadura do teu ninho
feito com o rosto peito e colo

em que me perca me derreta me desfaça
seio escorrendo seiva quentinha
na minha boca regalada
com uma lágrima pura tua misturada

que veludo seda cetim sentir-me assim
o teu cabelo longo farto
oscilando no embalo
quase a mexer quase parado
arrepiando-me a pele nua
sem qualquer defesa no contacto

menino de mim
que bem agora está que sossegado
nem acordado nem adormecido
apenas sentindo o calor o odor
o toque frágil humedecido
de leite lágrimas e beijos
em feminino mãe

o menino de mim
está tão forte agora
ronronando suspirando espreguiçando
chupando tacteando
que nele eu reconheço sem demora
o meu menino amado

biodiversidade e limites

A vida está cheia de espaço
diversidade
mas a necessidade de sobreviver
o medo
apertam o cerco à liberdade

e cada ser pequeno ou grande
como que começa a viver em círculos
a partir do ponto de referência
algemas compromissos dependências

por mais larga a auto estrada
que trilhamos
o percurso mais ousado do carril de ferro
até aos confins do mundo
sempre encontramos

algemas compromissos dependências

e as auto estradas que enfrentamos
os carris de ferro até aos confins do mundo
não passam das mesmas linhas trágicas
em que pouco ou nada mudamos

por mais voltas que demos
acabamos por achar os mesmos becos
longe ou perto
atalhos dúvidas limites
vai morrendo sempre o sonho de um viver liberto

quem percebe isto
vai tentando tenta sempre
mas porque é pouco o que consegue
e sobrevive em círculos
em tanta biodiversidade tanto sonho
sofre

e ou se adapta ou desiste
ou continuar a viver fica difícil

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

momentos difíceis

Um tropeção uma queda
um momento amargo
doença desilusão
quase sempre nos leva
à necessidade de uma referência
de um suporte
para o abismo
que nos assusta
na quase inevitável desistência

são coisas que aparecem de repente
na vida da gente
vazio vida sem sentido
que põem marcas no rosto
tristeza mágua horizonte negro

qual farol que via longe
alumiava
tinha uma missão
e de repente
uma falta de energia
uma quebra na corrente
e a noite fica escura
longa longa

parece nessa altura
que nunca mais o dia nasce
com a ansiedade a angústia
o medo
também pela quase ausência
de vontade
que se afasta
de o voltar ver a nascer

homem e árvore


É o movimento que perturba
que tem o mel e o fel

o tronco de árvore permanece firme
indiferente
ao sol à neve à chuva à trovoada
está
e basta-lhe estar para viver
para ser tudo o que é
sem se mexer

o homem não
tem que ir e vir
procurar bulir
lutar inventar
andar desandar
tropeçar cair levantar

mesmo assim continuar
o seu caminho imprevisto
o desfecho sem resposta
esgotando-se na sobrevivência

o movimento a inteligência
fazem toda a diferença

a árvore não precisa fazer nada
para viver
o homem precisa fazer tudo
para sobreviver

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

o arco íris de mim

Encho o peito de ar
na posição vertical
pernas e braços afastados
em humana perfeição
inspiro mar
atraio cores por todos os lados
rosa amarelo branco encarnado
lilás azul verde prateado
fico arco íris instantâneo
volátil intocável
leve
posso ficar neste formato
quando me apetecer
sou um deus instantâneo
à minha medida

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

solto o meu lado frágil

Solto o meu lado frágil
reconheço a carência a necessidade
como seara que se abandona ao vento

entrego-me

faço-o nas palavras novas que te digo
na mão que toca
que desenha contornos sem planear nada
no som balouçar do desanuviar do tacto

apetece-me ainda controlar às vezes
reprimir o que apetece
voltar ao circuito do pecado contenção

mas bem dentro de mim a alma chora
pede silêncio ao pensamento

e com um sorriso terno
diz para não ligar
ao que estou a pensar
que o amor está nos olhos
no brilho que acalma
e que faz sorrir

eu sem dar por isso
vejo-me com uma alma em chamas
um sorriso escancarado
um brilho intenso nos olhos
que me sinto de repente
no universo cintilante das estrelas

intenção desejo forte

Aqui estás tu
sou eu a imaginar
num domingo entardecer
em que nada mais há para fazer

consigo desenhar ou até mais
tocar
o teu rosto corpo cativante
até o beijo e volto a beijar
efusivamente

é estranho quando o faço
no realismo impressionante do contacto
que me pergunto

por um lado infantilmente
por outro com um rubor na face perturbante
que percorre o corpo todo
até ao sexo

se do outro lado imaginado
no compacto realismo do teu ser
sentirás algo

se a energia forte e boa
ausente
mas que sinto tão presente
se transmite a ti
na minha intenção desejo forte

um dia destes hei-de ganhar coragem
perguntar-te

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

saudável rebeldia

Deslizando escorregando
travagens ruidosas no asfalto
chiam skates

claro que incomoda tanta chiadeira
não o grito rebeldia natural da pouca idade
em energética necessária canseira
mas porque os meus olhos ao vê-los
não aguentam
quando se recompõem ainda
do sono desperto madrugada inteira

desloco-me então uns metros para cima
até onde aquela chiadeira diluísse
e no sítio em que me sento por instantes
fica uma árvore a olhar para mim
e eu para ela

reparei bem nela tentava perceber
porque ficáramos assim os dois
se algo haveria para aprender
com ela

olhei

tronco erecto bem pregado ao solo
subi os olhos
fixando-os nas ramificações
e vi que os ramos cresciam
serpenteando como ondas do mar

sorri em mente semi-adormecida
associando a jovem rebeldia do skate
mais abaixo
à rebeldia daqueles ramos suaves
que via ali bem na minha frente

dengosos meigos insinuados sinuosos
a contrastar com o porte rígido erecto
do tronco pai
estando-se borrifando para o aprumo
linha recta
compostura ancestral que o tronco era

portão da minha quinta

Que terna que és suave desejo permanente
portão da minha quinta em tempo de mimosas
sons melódicos melancólicos de sinos

de Espanha soprava um vento frio e seco
que arrefecia
mas também de lá aparecia o sol
que aquecia

a rodeira os canteiros de flores
o sabor macio e doce a feminino
que embriagava tantas vezes
um coração desolado Beira Serra

recantos bancos de jardim
fortuna de ser e de ter beijos
energia que nunca mais acabava
e que percorria
a raia de Espanha o cimo das muralhas dos castelos
o leito do rio

era bravia e terna a descoberta da vida
que me levaria a céus infernos
tantas vezes

amei tanto só para mim aqueles lugares
os muros as silvas com amoras
as moitas de carvalhos hortas ribanceiras
os carreiros os charcos com cegonhas
que me perdia entre a terra e o céu

só sentia medo quando percebia
que amava sozinho
um lugar onde era suposto estar
naquela idade

porquê tu me fazes hoje recordar
tão terna que és suave desejo permanente
o fio condutor melhor de mim
de uma estrada tão complexa?

Publicação em destaque

Livro "Mais poemas que vos deixo"

Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...