sábado, janeiro 11, 2020

Calças de inverno

Nota breve do autor do blog:

Acabo de receber um interessante texto, via email, escrito pelo meu irmão.
Vou partilhar o mesmo, pois para além de oportuno, pelo frio que se faz sentir, contém algumas imagens de vida que convém fixar. São imagens de tempos e lugares diferentes mas todas elas muito ilustrativas rumo à ideia principal: COMPRAR CALÇAS DE INVERNO NOS TEMPOS QUE CORREM.😮
Ora, caro leitor, faça o favor de ler o texto:


Calças de inverno 

A minha região é fria no inverno e concretamente na Guarda, capital do distrito a que pertenço, pude testemunhar grandes nevões, como de há anos se não vêem. Por vezes acontecia a água canalizada gelar nas respectivas condutas, o que podia causar, entre outros problemas, a rotura dos canos. As pessoas estavam habituadas a enfrentar tais contrariedades, substituindo por exemplo o chuveiro por uma banheira móvel, geralmente arredondada, onde era despejada água previamente aquecida. Claro que os banhos não aconteciam com a frequência com que alguns jovens de hoje o fazem, duas e três vezes ao dia!!!
Enfrentávamos a neve e o gelo bem agasalhados: Botas de couro, calças grossas (de inverno), luvas, sobretudo e boné de orelhas. Devo aqui fazer um reparo algo lamentável, a verdade é que nem todas as pessoas tinham possibilidades para se agasalharem convenientemente.
Após vários anos passados na região, rumei a Coimbra no início da década de 60, onde para mim foi notória a diferença de temperaturas. Aqui nem a capa, do fato de estudante, suportava ao ombro, trazendo-a habitualmente no braço.
À época Portugal suportava (mal) uma ditadura que, entre outras sacanices, perseguia os opositores e só concedia liberdade de expressão aos seus.
Ora os estudantes, na sua indiscutível maioria, tínhamos aversão ao regime salazarista e não raro manifestávamos o nosso desagrado, integrados geralmente nas respetivas Associações.
Esta década foi fértil em acontecimentos, no país e fora; seria fastidioso enumerá-los todos, ainda que pela rama! Mas o que mais me interessa salientar é o “maoismo”, que por volta de 1964 exportou muitos milhares de exemplares de um livro designado por “Livro Vermelho”, apreciado sobretudo nos países do 3.º mundo e com adeptos entre alguns dos estudantes portugueses. Pouco depois, em 1966 teve lugar a célebre “Revolução Cultural Chinesa” (pelo que veio a saber-se muito mais tarde, nada recomendável).
A figura central era o ditador Mao Tsé-tung; ele e a sua Guarda Vermelha fizeram o que lhes apeteceu, acusados de serem cúmplices da morte de milhões de compatriotas.
A par de outras ideias revolucionárias, como a de desativar o Ensino Superior, declararam guerra às “roupas burguesas” e quem as usasse podia ser atacado em plena rua!
O certo é que o grande líder se apresentava em público, nos mais variados atos, sempre de túnica (parecida com um vulgar casaco de pijama). Essa túnica (utilitária) passou a ser moda, conhecida por “Túnica Mao” e naturalmente calças a condizer! Guarda Vermelha, militares, camponeses, praticamente todo o mundo chinês andava assim vestido. Ao que consta, o tecido (conhecido por ganga) era grosseiro e estava disponível em três cores: Azul, verde e cinza.
A “fatiota” virou moda na China, mesmo para os que não gostavam, e granjeou grande simpatia internacionalmente. Lembro de ouvir uma frase que o ditador terá proferido com grande vaidade: “Meu povo de ganga azul”.
Relembro que estes acontecimentos decorreram essencialmente nos anos 60!
Estamos em 2020. Quis adquirir umas calças de inverno e, para grande espanto meu, só vi calças de ganga ou, esporadicamente, calças de bombazina (regra geral finas).
Ou seja, percorrendo as lojas todas, das mais chiques às menos chiques, as opções são idênticas: Ganga de várias cores (prevalecendo a cor azul) e bombazina (poucas).
Termino sugerindo um entretém engraçado: Vão a um Centro Comercial movimentado, a um jogo de futebol da 1.ª divisão (muita gente), a um Concerto desses cujos bilhetes se esgotam no ano anterior, à procissão do Adeus em Fátima, ou aguardem pelo S. João no Porto, e terão o privilégio de verificar que mais de 75% das pessoas vestem calças de ganga, de várias cores, seja verão ou inverno.
10 de Janeiro de 2020 – L. Pereira 

Fiquem bem,

Sem comentários:

Enviar um comentário

Publicação em destaque

Livro "Mais poemas que vos deixo"

Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...