sábado, março 24, 2007

apenas sinto existo

Estou no presente
abraço-o e gosto
não o posso agarrar
se bem que às vezes apeteça
vivo-o e deixo ir

compreendo o ritmo
a cadência
e sem ficar magoado triste deprimido
apenas sinto existo
aguardo
com paciência

o presente está sempre renovado
em cada momento diferente
e com um pouco de bom senso
de senso comum
monto-me na evolução
e vou no tempo

assim
estou sempre actual e vivo

repare-se no ronco do motor que se aproxima
aumenta a presença no encurtar da distância
há um ponto em que culmina
depois esgota-se
em afastamento na distância

e a questão é sempre a mesma
fico na distância antes ou depois
no sonho que foi
no que há-de vir…

ou delicio-me simplesmente
com o que de importante existe
no instante
breve
mas que está sempre a passar(?)

tradição sem sonho

Qualquer coisa em ti fez despertar
cantos de mim tão escondidos
reprimidos
que nunca sequer os vi
ou percebi
não sei onde andei
onde me escondi

agora percebo e vejo
ao ver-te aí
bem na minha frente
que estava morto e não vivi

enredado no escuro
preto e branco
capote cinzento guerra
ardendo queimado na fogueira
monge clausura sem afecto
em hábito condenado
pardo castanho triste figura

tu janela livre
livro por abrir
vida amor abraço liberdade
mundo de oportunidades

nesta fronteira
afirmo
que contigo darei os meus primeiros passos

não sei o que trago vestido
se estou descalço se calçado
se sou rico se mendigo
se tive ideais
ou se só me equivoquei

só sei
que quero nascer contigo
sair daqui
e amar pela primeira vez

domingo, março 18, 2007

vulcão por explodir

Eu amo-me nos teus olhos cintilantes
fico
na coragem que transmites

num gesto automático aceno não
gesto que não quer dizer que não
apenas um hábito céptico
assim como quem olha para ti
acha demais
e não acredita que o sonho às vezes acontece

uma flor porque é flor
pode cheirar-se
apreciar-se tocar-se despir-se
pegar nela e pô-la onde se quer

mas tu mulher
beleza flor atracção maior
como fazer-te o que se faz a uma flor

apetecia mandar-te estes versos perguntar-te
aguardar que me ensinasses a resposta
como me ensinaste a dizer sim
um sim ridículo eu sei
mas em onda rubor de confiança
ele fez parecer tudo possível
quando o disseste olhando linda para mim

passei amor por ti passei afecto
pus a minha alma toda no teu rosto
e o teu corpo sentia
porque eu via que sentia
tremia oscilava encolhia

eu só queria ser bom sentir o tacto
extravasar um pouco do vulcão adormecido
chama tanta ternura por explodir

e consegui devagarinho
em espaço tu tão receptor de chama e ansiedade
que um buraquinho abrisse fendesse
soltasse lava incandescente
quando os meus dedos se apuravam em ti
de cima abaixo

que bom partilhar um poucochinho
o fogo fechado que atrofia a gente
e dá cabo do coração

essa chama desejo história pessoal
que ficará gravada em mim
com o teu nome
a que chamarei vulcão
(por explodir)

sábado, março 17, 2007

Norte de África Marraquexe

Em som dança tambor índio
ritmado
um calor danado
o suor interior vertia para fora
em corpos quentes bem queimados
norte de África Marraquexe

posto em torpor que me levava
em pé quase dormia
cada perna desengonçava
os ombros sobre os braços pendurados

tan tan tan tan tan tan

a turma afinava o batuque batia
o meu ventre rodava
ao lado á frente atrás
ao lado outra vez

os olhos cerrados a cara tremendo
a boca caindo o corpo aquecendo
a mente parada
energia grupal não mais parava

tan tan tan tan tan tan

enchia alargava alimentava cegava
eu lá ia
tan tan tan tan tan tan
o batuque crescia

olhava outras pernas
olhava outros ventres
olhava outras caras

e o balanço era tal o transe o suor
que as pernas do outro eram as minhas
o peito do outro era o meu peito
o rosto do outro era o meu rosto

massa compacta cascata jorrando
cheiro a raiz a ventre
a mãe
rota da seda deserto calor
colo do mundo
assim sentindo
está-se tão bem

portuguesa bonita

Mafalda Pinto (bonita atriz portuguesa)



Que momento delicado
Que confrangedor arrepio
Nos teus braços eu senti
Sonho maior realizado

Com a respiração ofegante
Perguntei-me deslumbrado
Agradecido também
Porquê eu te mereci

Todo eu me baralhei
Até te disse até já
Como se eu te tivesse
Depois de ali acolá

Lembras campos lembras eiras
Lembras prados lembras rosas
Lembras canções semeadas
Sol e suor vindimadeiras

És portuguesa bonita
Morena esguia e sorris
Á tua volta espalhas
Os amores do meu país

E olhando para ti
Corpo em sorriso dançando
Alta bonita gentil
Acredita que esqueci
Ícones bem mediatizados

Cláudia Shiffer Nicole Kidman
A Shakira a Britney Spears
Mesmo a Anna Kournikova

E preferia-te a ti

domingo, março 11, 2007

grandes superfícies (ou solidão mal disfarçada)

Tenha que fazer coisas
ou não tenha
vou na mesma
os passos encaminham-me
eu a eles
quase que esbarro
ao entrar no labirinto

enfrento a confusão
faço o que faço nem sei que faço
tropeço
o ruído instala-se tira-me a voz
cada pessoa aparece desaparece
montra vitrine absorvente
em mundo de ninguém e tanta gente
em sítio prazer miragem baralhada
compras por fazer desejos por cumprir
frustração mais que assegurada

depois de escolher o melhor caminho
de evitar esbarrar mais no movimento
chego enfim a uma clareira
respiro
aliviando um pouco a canga na saída

já lá fora
até o vento forte
me parece brisa suave nas narinas

e as nuvens que ameaçam ruir
e encharcar-me
são bem vindas
no espaço querido no espaço grande
sinto-me de novo vivo
como nos campos que em menino eram distância
e davam ao olhar um perder de vista

mas mais logo ao outro dia
morto de solidão
também por necessidade
ou simplesmente com falta de imaginação
lá volto eu
a meter-me nas filas empurrões
circuitos integrados da civilização

e quanto mais me esforço
por compreender que a vida é isto
o progresso é isto
tão dramaticamente cheio
e tão perigosamente vazio
que me sinto

nem com tudo se concorda

Desenho nas palavras sentimentos que contenho
disfarço-os quase todos nos gestos
aprendidos
às vezes gastos
e que não levam já onde se quer

porque a mudança não espera
nem o hoje é só repetição
goste-se ou não
tem que abrir-se os braços
à inovação
ao fluir inexorável de outro tempo

tempo que será o ontem amanhã
é certo
mas é este aqui que conta
para nós

podem dar-se mil desculpas
ter reservas
podem reprimir-se inovações
(nem com tudo se concorda)

pode até estar-se contra
as decisões
mas desistir da nossa carruagem
do rumo que ainda é nosso
e tem destino

é como morrer antes do tempo
é como querer parar o que não pára
é como não querer ver asas nas aves a voar

e mais vale aproveitar
viver
se não der para correr
andar
se não der para andar
olhar
ver com um sorriso grato
o mundo a avançar

e apanhar uma carruagem
enquanto a vida
durar

terça-feira, março 06, 2007

olhar amor

Tudo no amor começa no olhar
pode-se sorrir chorar
ficar tão bem com a sensação
que tudo alastra ao corpo todo

a cor o rubor
o elo de vida o desatino
a loucura
a boca o coração

que sensação...
nada mesmo nada se compara a isto
está-se tão bem
o brilho a chama
o esplendor
o sentimento
que a duração
podia pelo menos ser eterna
ou mais ainda...

como não é
que o vulcão arda enquanto dura
e inunde em chamas tanto frio
que exploda
em êxtase incendiado encosta abaixo

que forças místicas tomem conta de nós
tão intensas
tão benignas
tão miraculosamente poderosas

que nos transportem ao infinito
e nos deixem lá
no silêncio total de quem está feliz
e a quem nada falta

a vida um poema

Sei que tenho sons bonitos no ouvido
um poema sempre para cantar
braços e passos para o levar

ah se a vida fosse um poema
e nos meus passos puxados pelo vento
eu chegasse ao ouvido de cada um

se pudesse pôr toda a gente nas asas do vento
na espiral de uma onda branca
gigantesca
que vertesse águas de neve
o som de uma balada
guitarras e palavras lindas misturadas

havia de ser uma onda convincente
pétalas de rosa vertidas em cascata

por ser tão bela
por onde passasse
havia o guerreiro de parar sua seta
havia o moribundo de sentir um novo alento
havia o trovão de calar-se
porque as crianças ouvem-no e assustam-se

havia de ficar no coração de cada um
uma festa permanente
um céu

medida certa

Porque terei de me dar tanto
quando me quero dar
e receber muito
quando quero receber

nunca encontro a medida certa

tal como um agricultor
que me habituei a ver
ou colheita farta
ou colheita sem vintém

nunca a medida certa

são bem menos os anos de fartura
bem mais os anos de desgraça
e apesar de haver sempre
a esperança
do ano certo que um dia vai chegar
a vida é mesmo assim um desacerto

solidários na desgraça ou na fartura
sou também agricultor
pródigo em vacas magras
ou gordas vacas
nunca a medida certa

sofro como ele
sonho como ele
acredito que o ano certo vai chegar
e com ele o acerto no tempero
do ter tanto
ou nada ter

Publicação em destaque

Livro "Mais poemas que vos deixo"

Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...