Nota breve do autor do blog:
Recebi este email que partilho com muito prazer.
Não é preciso concordar ou não concordar. O testemunho é o que conta no caso vertente. E na verdade o "desabafo do professor, jornalista e escritor", concorde-se ou não com o mesmo nas suas opções políticas, tem matéria significativa para servir pelo menos de reflexão nos dias que correm.
Partilho como recebi.
António Esperança Pereira
Mesmo a propósito no Dia Mundial do Livro…
Leonardo Haberkorn, jornalista e escritor, era professor numa
universidade de Montevideo. Deixou o ensino, que antes o apaixonava e
explica porquê.
"Depois de muitos e muitos anos, hoje dei a última aula na Universidade.
Cansei-me de lutar contra os telemóveis, contra o whatsapp e contra o
facebook. Ganharam-me. Rendo-me. Atiro a toalha ao chão.
Cansei-me de falar de assuntos que me apaixonam perante jovens que não
conseguem desviar a vista do telemóvel que não pára de receber
selfies.
Claro que nem todos são assim. Mas cada vez são mais
Até há três ou quatro anos a advertência para deixar o telemóvel de
lado durante 90 minutos, ainda que fosse só para não serem
mal-educados, ainda tinha algum efeito.
Agora não. Pode ser que seja eu, que me desgastei demasiado no
combate. Ou que esteja a fazer algo mal.
Mas há algo certo: muitos desses jovens não têm consciência do efeito
ofensivo e doloroso do que fazem. Além disso, cada vez é mais difícil
explicar como funciona o jornalismo a pessoas que o não consomem nem
vêem sentido em estar informadas.
Esta semana foi tratado o tema Venezuela. Só uma estudante entre 20
conseguiu explicar o básico do conflito. O muito básico. O resto não
fazia a mais pequena ideia. Perguntei-lhes (...) o que se passa na
Síria? Silêncio. Que partido é mais liberal ou que está mais à
'esquerda' nos Estados Unidos, os democratas ou os republicanos?
Silêncio. Sabem quem é Vargas Llosa?
Alguém leu algum dos seus livros? Não, ninguém! Lamento que os jovens
não possam deixar o telemóvel, nem na aula. Levar pessoas tão
desinformadas para o jornalismo é complicado.
É como ensinar botânica a alguém que vem de um planeta onde não
existem vegetais. Num exercício em que deviam sair para procurar uma
notícia na rua, uma estudante regressou com a notícia de que se
vendiam, ainda, jornais e revistas na rua.
Estes jovens, que continuam a ter inteligência, simpatia e
afabilidade, foram enganados, a culpa não é só deles. A incultura, o
desinteresse e a alienação não nasceram com eles.
Foram-lhes matando a curiosidade e, cada professor que deixou de lhes
corrigir as faltas de ortografia, ensinou-lhes que tudo é mais ou
menos o mesmo. Então, quando compreendemos que eles também são
vítimas, quase sem darmos conta vamos baixando a guarda.
E o mau é aprovado como medíocre e o medíocre passa por bom, e o bom,
as poucas vezes que acontece, celebra-se como se fosse brilhante. Não
quero fazer parte deste círculo perverso. Nunca fui assim e não serei
assim.
O que faço sempre fiz questão de o fazer bem. O melhor possível. E não
suporto o desinteresse face a cada pergunta que faço e para a qual a
resposta é o silêncio. Silêncio. Silêncio. Silêncio. Eles queriam que
a aula terminasse. Eu também."
Leonardo Haberkorn, jornalista e escritor, era professor numa
universidade de Montevideo. Deixou o ensino, que antes o apaixonava e
explica porquê.
"Depois de muitos e muitos anos, hoje dei a última aula na Universidade.
Cansei-me de lutar contra os telemóveis, contra o whatsapp e contra o
facebook. Ganharam-me. Rendo-me. Atiro a toalha ao chão.
Cansei-me de falar de assuntos que me apaixonam perante jovens que não
conseguem desviar a vista do telemóvel que não pára de receber
selfies.
Claro que nem todos são assim. Mas cada vez são mais
Até há três ou quatro anos a advertência para deixar o telemóvel de
lado durante 90 minutos, ainda que fosse só para não serem
mal-educados, ainda tinha algum efeito.
Agora não. Pode ser que seja eu, que me desgastei demasiado no
combate. Ou que esteja a fazer algo mal.
Mas há algo certo: muitos desses jovens não têm consciência do efeito
ofensivo e doloroso do que fazem. Além disso, cada vez é mais difícil
explicar como funciona o jornalismo a pessoas que o não consomem nem
vêem sentido em estar informadas.
Esta semana foi tratado o tema Venezuela. Só uma estudante entre 20
conseguiu explicar o básico do conflito. O muito básico. O resto não
fazia a mais pequena ideia. Perguntei-lhes (...) o que se passa na
Síria? Silêncio. Que partido é mais liberal ou que está mais à
'esquerda' nos Estados Unidos, os democratas ou os republicanos?
Silêncio. Sabem quem é Vargas Llosa?
Alguém leu algum dos seus livros? Não, ninguém! Lamento que os jovens
não possam deixar o telemóvel, nem na aula. Levar pessoas tão
desinformadas para o jornalismo é complicado.
É como ensinar botânica a alguém que vem de um planeta onde não
existem vegetais. Num exercício em que deviam sair para procurar uma
notícia na rua, uma estudante regressou com a notícia de que se
vendiam, ainda, jornais e revistas na rua.
Estes jovens, que continuam a ter inteligência, simpatia e
afabilidade, foram enganados, a culpa não é só deles. A incultura, o
desinteresse e a alienação não nasceram com eles.
Foram-lhes matando a curiosidade e, cada professor que deixou de lhes
corrigir as faltas de ortografia, ensinou-lhes que tudo é mais ou
menos o mesmo. Então, quando compreendemos que eles também são
vítimas, quase sem darmos conta vamos baixando a guarda.
E o mau é aprovado como medíocre e o medíocre passa por bom, e o bom,
as poucas vezes que acontece, celebra-se como se fosse brilhante. Não
quero fazer parte deste círculo perverso. Nunca fui assim e não serei
assim.
O que faço sempre fiz questão de o fazer bem. O melhor possível. E não
suporto o desinteresse face a cada pergunta que faço e para a qual a
resposta é o silêncio. Silêncio. Silêncio. Silêncio. Eles queriam que
a aula terminasse. Eu também."
LH
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