segunda-feira, agosto 25, 2008

falar de amor


Soube-me bem
falar de amor de sentimento
inflar o peito a todo o pano
como se quisesse
pudesse
no meu barco já pequeno
dar ainda a volta ao mundo
de oceano em oceano

que água fresca que caía
cascata de esperança
nas palavras!
Japão Tailândia
Neptuno Marte
tão possíveis de alcançar
pela alma alargada que sentia

fala-me de amor
para eu voar
sentir
mas não fiques
por favor não fiques
para não teres um dia
que partir

quero como o sol
que vás que voltes
para não te aborreceres
hei-de encontrar-te sempre
quando apareceres com ele
por detrás do monte...

quente rubra livre
para te abraçar
num ciclo intenso e eterno

sábado, agosto 23, 2008

o aqui da vida

O que faz mal mesmo
é apoderarmo-nos de tudo
das pessoas das coisas
dos lugares

porque o adeus chega sempre
umas vezes com pezinhos de veludo
outras abruptamente

de nada serve a dependência
a luta inglória
porque o tempo ganha sempre
leva separa tira

e o que dá
embora pareça um castelo
um palácio a ouro debruado
a coisa mais bela
com que jamais sonhámos...

de repente a coisa
(ou nós)
se vai embora

é maior a dor
se não entendermos isto
é ilusão pura
a soberana permanência

é dor profunda
prendermos o que tem asas e voa...

resta-nos a graça do momento
o aqui da vida
desprendido
agradado e leve

sexta-feira, agosto 22, 2008

encorajar faz falta

Cada parte de nós pode falhar
de vez em quando
não é por isso que a vou abandonar

é na dificuldade
que encorajar faz falta
persistir uma necessidade
para continuar

repare-se no relógio
certinho
sempre a trabalhar
um dia começa-se a atrasar
em vez de lhe darmos a mão
agradecer-lhe a eficiência
a dedicação
a disponibilidade que teve sempre
sem errar

zás!

zangados mal agradecidos
irados
logo o jogamos fora
e o lançamos à parede

olha se eu fizesse o mesmo
à cabeça
numa qualquer enxaqueca?!
ao baixo ventre
num qualquer entupimento?!

nada restaria de mim
em pouco tempo!

órgãos dos sentidos

Os olhos e a zona que os circunda
(cabecinha incluída)
é órgão de sentido sobre usado
cansam-se os olhos de tanto ver
dói a cabeça de tanta mensagem
ler

é preciso
temperar melhor
equilibrar
estender a actividade
à aplicação
de todos os órgãos dos sentidos

porque não poupar
alguns deles de vez em quando
e pôr outros a funcionar?

evita-se que uns fiquem atrofiados
por subutilizados
tristes por não poderem mostrar
as capacidades
e outros cansados
por tanto trabalhar

puxa mais a sociedade
mediatizada de consumo
pelo desempenho
pela ansiedade
e no deslumbramento
de tanta novidade
são os olhos quem mais paga

desligue-se um pouco a tv
perturbe-se menos a visão
com tanta distracção

procure-se mais regularmente a natureza
menos regularmente as catedrais da moda
deslumbramento tornado frustração

dê por si em alegria
tacteando descobrindo a vida
tanta coisa boa à espera do seu tacto!

sinta
cheire
ouça

descubra enfim o sentimento
o maravilhoso que há em si por descobrir

terça-feira, agosto 19, 2008

canção do emigrante, em jeito de

Tinha saudades
andava triste
quem está longe
não resiste

é Portugal no coração
é a nossa terra
é o nosso berço
nossa paixão

sou o Manel
nasci aqui
sou emigrante
voltei pr'a ti

vi minha casa
meus pais velhinhos
e a Maria
nos teus caminhos

ó minha terra
pr'a cá do mar
eu ficarei
para te amar

e o longe longe
tem dono tem
que fique lá
quem lhe quer bem

Deusa menina


Linda simpática delicada
uma graça no desenrolar do movimento
desde o simples apontar do dedo
ao descobrir equacionar
cada segredo

a ideia certa
transmitida por uma cabecinha
que parece por momentos que adivinha
qual escultura feminina
com oscilações imperceptíveis
na postura

uma deusa enorme
em forma de menina

que deus te leve onde queres ir
deusa menina
ou mais ainda

mundo melhor
amor sem questionar
princípio do céu
só de te ouvir

só posso dizer
que bom ser acariciado pela palavra
sentir a solução

chega a parecer
olhando para ti
em esbelta simplicidade
que tudo pode acontecer
ou quase
com toda a facilidade

a magia o amor
a paz a festa
um paraíso sem fim
pela eternidade

o espaço vazio

Só o vazio determina
que além do meu ponto
lugar em que me encontro
haja outro ponto
onde não me encontro

e outros pontos
noutros lugares

para existirem
para dizermos
que há longe
que há perto
aqui além acolá
um planeta um país
um animal
uma planta

é necessária
a existência invisível
do espaço

do vazio...

tal como o silêncio
é princípio e fim do ruído

assim o vazio
na cidade no campo
no universo
em toda a parte

é princípio e fim
de tudo o que vemos

terça-feira, agosto 12, 2008

esperança amiga

Esperança amiga
fantasia
de toda uma vida
espelho cruel
do meu processo

engodo enigma
o que queres de mim?

dizer-me que a vida já foi
ou que está aí?

dizer-me que só engano existe
no que faço
ou que é este o desejado passo
nunca dado?

que é tempo de deserto
ou de jardim encantado
que guardaste
para mim?

que é chegada enfim
a invernia
ou que pode haver primavera
ainda?

diz-me que eu não sei

viajo muito nos olhos

Viajo muito nos olhos
na aprovação dos outros
desanimo quando é de animar
contradigo-me
em cada afirmação

quando chego lá
e se mostra a ocasião
com algum
mesmo talvez muito cansaço

que falta que me faz
repousar sentar
parar recuperar

ter assim um cair em mim
estático sossegado
de suor húmido
recolhido
sem mais nada

acreditar só no lugar
sem sequer o ver
ou aceitar

para depois
com voz recuperada do cansaço
firme pausada
com ou sem alento
dizer o que me vai na alma

pedir sussurar abraçar
ir na vida como se fosse natural
aceite por quem me quiser levar
tal como sou

acordar com atitude

Eu quero acordar com atitude
um rumo

que não sinta só o rabugento
fechado enfastiado ar da obrigação
a fobia que causam as divisões pequenas
celas de uma vida escurecida
persianas corridas
copiando a régua e esquadro
cada movimento do dia anterior

se eu corresse ao despertar
um pouco o cortinado
deixasse entrar a luz que é vida
e antes mesmo de pensar fizesse?

se logo de manhã me borrifasse no correcto
no meticuloso ciclo do relógio
se eu alterasse assim que acordasse
a importância das coisas?

e visse com olhos de ver
solto livre espreguiçado
num conforto novo
ou desconforto desafiante
a beleza da vida
vista mesmo do lado de mim?

sem o obrigatório amanhecer em frete
remeloso cambaleante
somado a outros que já passaram
e outros que hão-de vir?

Deusa venerada


Claro que gostava
de fazer amor contigo
(qualquer homem gostaria)

mas isso é apenas pormenor
em tanto que me apetecia
fazer contigo

sentir o medo em cada orgão de sentido
tocar teu tacto com meu tacto
o meu sabor com teu sabor
cheirar-te como se cheira uma flor
sensível breve

percorrer com os olhos cada pormenor
como se quisesse gravar na tela
num poema belo
cada célula de ti

tocar-te sempre
marcar-te
deslizando em cem por cento de atenção
dedicação
como se fosses solo pátrio
terra mãe amada

fosse que tempo fosse
que eu te desse
havia de ser só teu
esquecimento e suavidade
todo o tempo

serias deusa venerada
eu um deus menor
descobrindo o céu!

domingo, agosto 10, 2008

mulher emancipada(?)


Tudo faz sem explicar
nem contas dar
com ar desenvolto
autoritário
sempre a mandar

impressiona
quem está mais desatento
a quem vê tanta acção em movimento

mas eu quando fico mais mental
crítico céptico
e me ponho a pensar
olho para aquela mulher
e em vez de a achar
determinada
eficiente
como já lhe ouvi chamar

penso na emancipação da mulher
e no ridículo que é
querer parecer ter mais mãos
mais pés
do que é normal

querer parecer mais competente
que a própria competência

é muita emancipação em movimento!

e nem um saborzinho a anjo
só que seja
na mulher veloz
rude seca agreste
onde pouco já flameja
o feminino

festa e sinfonia

O ambiente gerado
no local
cansa uns anima outros

eu que estou a observar
o que se passa
sou levado a pensar
que não há sinfonia
com cada qual
a tocar para seu lado

o espectáculo da festa
que se queria animada
acaba em cansaço
quase em tragédia
pela falta de partilha

mais umas notas desafinadas
sobrepostas
exaustas
e não chega a vontade
de agradar
se não se souber tocar
avaliar aprimorar

e finalmente aceitar
que para haver festa
uma sinfonia afinada
tem que gerar-se empatia
e limar-se muita aresta

como há charangas e orquestras
também há
grandes secas e grandes festas

domingo, agosto 03, 2008

estranho milagre

O milagre que acontece
em sugestão
pode durar um instante apenas
muito tempo até
conforme a convicção
a expectativa que o remédio é

um bruxo milagreiro conseguia
curas de fazer pasmar
a quem delas ouvia falar

conta porém quem viu
e quem experimentou
sem vergonha de contar
que o que com ele se passou
foi relação homossexual

queixava-se de impotência
males do ventre
corpo vergado doente
pelo que era urgente
aliviar a existência
ir o bruxo consultar

após diagnóstico peculiar
com cenas capazes de impressionar
depressa o curandeiro foi
direito ao mal

doze tratamentos a cuidar
de um nervo bem fininho
situado no chacra sexual

iniciado o tratamento
era fácil começar
no nervo
e passar às partes próximas

o homem honesto hesitava
tremia
sempre que ele lhe tocava

mas se não colaborasse
(pensava)
lá se iria o milagre
de que tanto precisava

durante doze semanas
um dia de peregrinação
pôs a família feliz
com excelente evolução

o que ninguém suspeitava
naquela felicidade
era que o milagre que havia
estava na sexualidade
que fora ali despertada
diferente da que vivia

sábado, agosto 02, 2008

oásis ou deserto

Ninguém sabe ao certo
se é oásis ou deserto
o que tem
toda a referência está tão perto
que nos parece espelho
do que temos

se não temos medo ainda olhamos
se temos medo de ver
o que não queremos
já nem vemos

dá jeito interiorizar
uma verdade absoluta
própria estática
como se toda a razão
fosse só nossa

um papel monocórdico
de uma peça de palco
vista revista
usada como embuste
toda a vida

só que assim
não há esforço nenhum
nem sementes novas
nem consciência sequer
para perceber
se o que realmente se tem
neste universo...

é oásis
ou deserto!

é excitação a mais

É excitação a mais
para uma vida tão pacata!

é mar a mais
para um barco tão pequeno!

ir longe navegar
sair da velha escarpa
triste pobre isolada
agreste

exige trabalho querer
e menos "faz de conta"

de que vale dizer
afirmar berrar
só da boca para fora
a vontade de mudar?

se quando chega a hora
e os ventos sopram
de feição
a excitação pára...

e nem um passo se dá?!

se a vontade real
e interior
é não fazer nada
para mudar...

da carga pesada
alta escarpada
do velho promontório
que se teima em carregar?

quarto escuro

Lembro a sala fechada
trancada
recheada de móveis e valores
de coisas valiosas boas
que em menino quase nunca
vi aberta

também o quarto reservado
a familiar ilustre
que de quando em vez aparecia
vindo de Lisboa

restava-me a cozinha
o corredor
um quarto escuro
e pouco mais

eu que era passarinho
livre
que tinha ganas de voar
parecia quantas vezes
morcego triste em noite escura
a esbarrar num espaço curto

"ali não mexas
ali não vás"

ouvia!

eu espreitava pela porta
e via lá fora
um mundo de luz
imenso
que começava num pátio
e continuava pelo campo
com barulho de gente
até ao silêncio distante
do espaço

como entendo hoje
a necessidade permanente
de ultrapassar o horizonte
correr mundo
ver gente

de ficar inquieto
quando penso
que em tantos lugares
esse horizonte ainda é curto
fechado triste
como a casa trancada cinzenta
o quarto escuro
onde em menino cresci

a vida exige

A vida exige
é dura
nem sempre há ninho
ternura

instala-se a raiva
revolta
o verbo não sai
sem aceitação
desanima-se dói
em rejeição

recorre-se ao pai
à mãe
ao colega do lado
ao professor
ao amigo
ao doutor

e nada
não há resposta para nós

a ferida instala-se
cresce
o dia claro enegrece

o sucesso é dos outros
as qualidades dos outros
é tudo dos outros

abraça-se o caminho mais fácil
desiste-se

e mais uma vítima nasce

Publicação em destaque

Livro "Mais poemas que vos deixo"

Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...