Herberto Hélder de Oliveira (Funchal, São Pedro, 23 de novembro de 1930 – Cascais, Cascais, 23 de março de 2015 ) foi um poeta português, considerado o "maior poeta português da segunda metade do século XX" e um dos mentores da Poesia Experimental Portuguesa.
Partilho ao acaso três poemas do Autor.
Espero que gostem.
Ah, e nem é preciso dizer que os poetas portugueses que tenho vindo a divulgar merecem uma visita bem demorada e detalhada. O que aqui fica (pouco mais que a identificação) é mesmo apenas um "cheirinho".
Eles agradecem essa visita demorada e detalhada.
Aos amigos
Amo devagar os amigos que são tristes com cinco dedos de cada lado.
Os amigos que enlouquecem e estão sentados, fechando os olhos,
com os livros atrás a arder para toda a eternidade.
Não os chamo, e eles voltam-se profundamente
dentro do fogo.
-Temos um talento doloroso e obscuro.
construímos um lugar de silêncio.
De paixão.
Como uma rosa no fundo da cabeça
Como uma rosa no fundo da cabeça,que maneira obscura
de morte.O perfume a sangue à volta da camisa
fria,a boca cheia de ar,a memória
ecoando como as vozes
de agora.Onde está sentada brilha de tantas
moléculas
vivas,tanto hidrogénio,tanta seda escorregadia dos ombros
para baixo.Toca eu
de onde rompe a rosa.uma criança
luciferina.A mãe fechava,
abria em torno a torrente dos átomos
sobre a cara.Aquilo que a estrangula dos pulmões
à garganta
é a rosa infundida.Leva um braço às costas,
suando,raiando
pelo sono fora.Está queimada onde lhe toca.Falaria alto
se o peso a enterrasse à altura das vozes.
Via a matéria radiosa de que é feito o mundo.
A língua doce de leite,
a mão direita na massa agre,o sexo banhado
no manancial secreto.
O dom que transtorna a criança ardente é leve como
a respiração,leve como
a agonia.
Uma rosa no fundo da cabeça.
O olhar é um pensamento
Tudo assalta tudo,e eu sou a imagem de tudo.
O dia roda o dorso e mostra as queimaduras,
a luz cambaleia,
a beleza é ameaçadora
-não posso escrever mais alto
transmitem-se,interiores,as formas.
in:Poesia Toda,1990
Fiquem bem,