sexta-feira, novembro 28, 2008

a dança da garça


Ia esforçava tentava
uma perna flectia
o braço em jeito de asa
esticava

sozinho na dança da garça
esvoaçava

sem a graça dela
o corpo cansava
com asas sem penas
eu ficava tenso

vai que não vai
cai que não cai
abaixo levanta
o meu equilíbrio…
AI AI!

fechava os olhos
abria-os
para ver como as outras garças
faziam

uma delas em frente
baixava elevava levantava
eu diria
tal a harmonia do voo
que aparecia desaparecia
ora subindo nos ares
ora aterrando

numa descida planando
com a asa tocou-me

eu já desistia
pesava-me o corpo
o ânimo sumia
mas depois daquele toque
ligeiro
agradado companheiro

eu vos digo

que mesmo a brincar
um pequeno gesto
tudo pode mudar

naquele instante senti
que até humano pode voar!

esculturas perfeitas


Enleados colados
um calor dos diabos

que esculturas perfeitas
que eram
aqueles cachos
de corpos cansados

os braços o peito
as pernas os pés
ocupando
espaços sobrados

num silêncio calado
os rostos brilhando
os olhos fechados
a vida pulsando

energia completa
dar receber
respirar amar
núcleo do SER
que em nós habita

e para nosso mal
pouco se agita
no fado usual
de sobreviver

domingo, novembro 23, 2008

uma mão estendida


Alguém pedia
de mão estendida
os olhos brilhavam
à moeda que caía

das árvores despidas
folhas tombavam
jaziam
espalhadas na avenida

alguma gente passava
após missa acabada
na igreja ao lado

alimento de esperança
a moeda dada
a missa acabada

depois é a espera
a viagem
a noite e o nada

senti ali
a esperança
em que estamos
entre alguma coisa
e não sabemos o quê

esse intervalo
é o brilho dos olhos
o conforto o consolo
o tempo certo
porque depois
mais nada se vê

sexta-feira, novembro 21, 2008

fontana di trevi


Eu sei que a água ali é pouca
para quem tem um oceano à sua porta
uns quantos fios de cascata
nada mais
mas é água quanto baste
para recordar recordar
e voltar a recordar!

então vista de ti
dos teus sonhos
céu azul de Portugal
rubro de papoilas
espelhando namorados
em teu rosto lindo…

que loucura de local!

se eu pudesse lá estar
no dia iluminado em que estiveste
pela beleza de ti
perdia-me de vez
nas pizzas e nos vinhos
nas vielas nas praças
nas ruínas
feitas para se desaparecer nelas

bebido comido inebriado
apaixonado

que importaria o resto
o dia seguinte
as obrigações
a agenda por cumprir
se se tinha encontrado
o melhor de Portugal
num sítio encantado do mundo?

primeira ida ao mar


A minha primeira ida ao mar
à praia
foi assim como levar
a minha terra deserta
seca pela geada e pelo sol
a um oceano de água
e de gente

aquelas ondas medonhas
frias
que sabiam a sal da cozinha
de casa
que engasgavam
que faziam tossir e cuspir
assustavam-me

não entendia para que aquilo servia

nuzinho lá ia
empurrado levado
na vaga pesada
eu tiritava de frio
chorava
de medo de areia vestido
na humidade sombria
no nevoeiro cerrado

mal vi o sol dessa vez
em quinze dias seguidos
só mais tarde entendi
o verdadeiro sentido
de se ir ali

saber-se o que se quer

Saber-se o que se quer
depois ir sem medo
como velejar e acreditar no vento
como cheirar e acreditar no cheiro

só se pode aprender experimentando

apreciar cada momento
sem pensar
porque o pensamento sabe muito
e causa medo
quando nos diz
que tudo o que é bom
começa e termina cedo

por isso nem começamos

ou desligamos a mente
e cuidamos bem
e só cada momento
a leveza do ser
com intuição e sentimento

ou utilizamos a mente
o pensamento
só o tempo certo
sem que nos possa
causar dano
sofrimento
com o seu saber omnisciente

terça-feira, novembro 18, 2008

quero amar (canção em jeito de "rap")

Quero amar quero amar
deixar ir e deixo
os tempos idos
que não voltam mais
a novidade a luz eu quero
aqui

amar é meu desejo
ser forte receber e dar
estou vivo e gosto
meu amor vou partilhar

é saudável ter sucesso
saber ver ouvir sentir
dar-te um abraço a ti
para alegrar

quero amar quero amar
deixar ir e deixo
os tempos idos
que não voltam mais

quero viver esta aventura
esta rua este jardim
esta fartura
que agradeço aos pais avós
ao meu país ao universo

eu quero amar quero amar
deixar ir e deixo
os tempos idos
que não voltam mais

a novidade a luz eu quero
aqui
neste espaço imenso
a que pertenço

domingo, novembro 16, 2008

os ditadores e a razão


A sociedade julga sempre as situações
chama nomes
faz marcações
num controlo apertado
que nem serve gregos nem troianos
por desactualizado

qualquer líder medíocre
parece genial
basta-lhe berrar o trivial
que assim é bem
assim é mal
que assim é justo
assim injusto

se houver animação
não controlada
leva-se porrada
a conter a intuição

e o impulso morre assim
na proibição do não
a matar o sim

tantas regras de conduta
proibições
que só dão impedimentos
frustrações

alivie -se o ser de tanto racional
soltem-se as emoções os sentimentos
diga-se basta aos ditadores
a tanta gente a mandar mal

o passado já passou


O passado já passou
está longe
no tempo
na distância

não se aguenta a excentricidade
de confundir presente
realidade
vida
com outra qualquer leviandade
já andada inexistente
morta

por lado a lado
as duas
sonho ilusão distância
e realidade…

é como misturar
querer meter no mesmo saco
mentira e verdade
e aceitar ambas
com a mesma credibilidade

é como acreditar
que é possível
estar
na procissão e no adro
ao mesmo tempo

é como ficar
a meio de SER
e não viver

segunda-feira, novembro 10, 2008

a santidade e o pecador


A santidade justifica o pecador
sabe-se
atira os outros para a dor
o mal estar da consciência

perante o mostruário de virtudes
da beatífica assexuada feia santa
tão anormais que somos
não há passo bom
com cor aroma cheiro
que seja acertado
nem aconselhado

beatíficas esposas se tementes
demoníacas se descrentes!

Deus e o mundo nada têm a ver com isto
com a moral desactualizada
ensinada
é tudo tão mais essencial
pequenos nadas
o ar uma flor dançar
uma mão um amigo
trabalhar
que a santidade pregada no altar
só serve para controlar

e de consciência controlada
o pecador
coitado
fica isolado humilhado
anormal na sua normalidade
perante a virtude apregoada

sente-se mal e condenado
com tanto pecado
no rebanho hipócrita
da sua comunidade

e não há santo que lhe valha
ou que o venha salvar!

sexta-feira, novembro 07, 2008

música terapêutica

A alma precisa de silêncio
paz
depois de sons tónicos
que elevem o potencial
do nosso sentir interior

uma abertura consciente
a essa dimensão musical
consola vitaliza
rejuvenesce

se a escolha for adequada
houver sintonia
entre os sons da vida
e a alma
esta alimenta-se dá brilho
acalma

uma sensação semelhante
a inalação de ar
fresco colorido
crescendo nas narinas
espalhando-se depois ao corpo todo
qual doce arco-íris de veludo

o resultado pode ser
uma deliciosa quietude
radiante iluminada
sossegada

pode ser também o impulso perfeito
para correr saltar dançar
inebriar-se na nudez
de uma alegria
contagiada contagiante
só entendida pelos deuses

saio da noite em pesadelo

Saio da noite madrugada
em pesadelo

cai-me ao pequeno almoço
uma cárie dentária
deixando em seu lugar
um buraco uma cratera
onde o ar a água o alimento
causam dor

perturba-me a dor
a idade física
a exposição aos outros
hoje e sempre questionada

mais uma vez
o meu carro é companheiro de abalada
um amparo na solidão velocidade
em que acalmo
apaziguo cruzando a estrada
no silvo do vento
na paisagem desfocada

que explicação para meus extremos?

ou paro medito estabilizo a inquietude
em total e impressionante quietude…

ou parto desatinado
como agora
para me encontrar em meteórico movimento!

de que fujo?
que procuro?
que haverá que vejo ou que não vejo
que me faz murchar parar
ou correr acelerar?

segunda-feira, novembro 03, 2008

mergulho nos teus olhos

Mergulho nos teus olhos luz
de madre pérola
espelho profundo dos meus

melhor que em sítio nenhum
vejo que há longe perto
flor amor paz
viagem encantada

entrar neles
sorrir com eles é estar
num túnel protegido
onde me perco

túnel fechado
meu e teu somente
e simultaneamente
aberto descomplexo
debaixo do céu

não sei se existo
se há tarefas por cumprir
se há mais qualquer coisa fora daqui

só sei
que estou feliz e completo
aqui
no fundo dos teus olhos

que o diga a lágrima iluminada
que aparece
que brilha que me queima
e que sorri!

a cada um o seu papel

A cada um o seu papel
a sua função
um existe
para o outro existir
e vice-versa

há o juiz
o infractor
o polícia o ladrão
o aluno o professor
o homem a mulher
a presa o predador

quem fez isto assim
fê-lo bem feito
uma espécie de organização
pensada em molde
“complemento”

e goste-se ou não
queira-se ou não
tudo vai girando
mesmo sem grande entendimento

como que o natural funcionamento
compensa
a geral desadaptação
e falta de contentamento

enquadro-me comigo

Enquadro-me comigo
com o que sou
com o que posso
com o que quero
escolho o que preciso
e vou

depressa encontro o desafio
a nódoa no tecido
a pergunta sem resposta
a solução por descobrir

mas está um dia Outono lindo
não dá para não ir
deixo para trás o embaraço
a notícia triste
da imprensa do quiosque a deprimir
e animo

sei que a seguir
há sossego e mimo
a consolar as pedras do caminho

a natureza para onde vou
não quer saber
de tricas ditos
mexericos
taras vitórias e derrotas
medos

apenas é o que é
e está onde está

por isso hoje dia quezilento
de má língua eleições
outras confusões
é para lá que vou

receptivo confiante

Receptivo firme
confiante
pousado concentrado
braços abertos de gigante
inebriado consolado
atento sem qualquer julgamento

assim me apresento
escancarado e crente
diante do amor
que está na minha frente
a menos de um palmo
de mim

voz romântica

A voz romântica que ouço
estende voa
o meu coração respira
um “slide show” mágico de cores
sítios sentimentos
aproxima distância geográfica
e tempo
numa só idade

que êxtase fascinante
a vida toda
percebida no melhor detalhe
neste instante

o lindo dos teus olhos
aquele regato aquele regaço
o branco amendoeira
o amarelo quente das mimosas

os gestos imprecisos
que faziam rir
a malícia que fazia tanto bem
de tão ingénua que era

que filme de vida sinto e vejo
entrando pelo ouvido
nesta voz romântica…

de tal forma fico em transe
com ela
que sou capaz
de dar vida a sítios idos
a gente morta
ou perdida na distância
e a quem tanto quero!

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Livro "Mais poemas que vos deixo"

Breve comentário: Escrevo hoje apenas meia dúzia de palavras para partilhar a notícia com os estimados leitores do blogue, espalhados ...