sexta-feira, novembro 30, 2007

o meu menino amado

Que bom ver nos teus olhos que eu existo
no embalo que balança
o meu menino amado

perdia já o controle de quem eu era
em calor umbilical chamei-te mãe
apertado protegido no macio dos teus seios
aninhado no teu colo
sentia só o teu cuidado

turpor amor
enebriado e amado

Nossa Senhora deve ser assim
ter o teu sorriso
o teu macio
o teu rosto de anjo
ter a tua mão que só de a sentir
se sente o Céu

que sorte que sinto por ter sido
pelo menos uma vez
o teu menino
eu
o menino de minha mãe

sexta-feira, novembro 23, 2007

trova do "tempo" que passa


Uns dizem pára
meditação
outros para não parares
musculação

há quem te encha de gorduras
depois quem tas vá tirar

magro à força à força deprimido
há quem pregue a oração
como solução
todos te prometem o paraíso
nesta grande confusão

tanta liberdade de fartura
está a tornar-se uma tortura
meu irmão

senão repara
liberais modernos democratas
que parecemos
recheados de berliques e berloques
novos ricos não cansados de o ser
berramos por Salazar tão pouco amado
e por tantos odiado
em estranha votação
realizada pela tv

realmente em mundo tão diverso
complicado
há que sonhar com pai que nos proteja
de tanta escolha difícil de fazer
nem que seja um pai tirano

até ele aparecer
e tomar conta de nós
continuamos
sem nada compreender

compro botas ou sapatos
desta marca ou daquela
mudo de casa ou de carro
qual a idade de casar
filhos sim ou filhos não
fico cá vou viajar

tanta oportunidade nova

Podia andar triste com o que não tenho
e queria ter
claro que podia
cabisbaixo espírito toldado
desanimado pela falta de sucesso
no que faço

podia até perder o apetite
o gosto o paladar
aceitar a punição
o lado negativo do que vejo e sinto
achar isso natural

podia ver só o lado dor
ausência vil saudade
podia até deixar de viver
claro que podia

mas se em vez de não viver
eu acordasse
hoje
como se fosse o meu primeiro dia

se percebesse
em cada falta de sentido
o sentido todo
que a falta de sentido tem

se descobrisse
em espelho exterior
o meu interior reflectido
a luz a cor
tanta coisa por fazer
tanta oportunidade nova
e tanto amor!

quinta-feira, novembro 15, 2007

um "apoucado" na fila das compras

Um espaço amplo papelaria livros escolares
também dos outros
outras secções comerciais para rendibilizar o espaço
havia saldos
era Agosto e muita gente
emigrantes reformados estudantes
gente mais escura gente mais branca

na confusão das compras
gerava-se alguma agitação
e era evidente a falta de paciência
na espera da caixa

o barulho ficava no sítio dos produtos
ali reinava mais o silêncio alinhado crispado
de quem prepara o dever cívico de pagar a conta

um rapagão com uma senhora
corpo de homem idade de menino
na espera desconsolada das caras sérias
pouco empáticas que o cercavam
para se entreter talvez
passou a mão com um encostão
pelo corpo de uma loirinha

usava um top cor de rosa calça bem justinha
que descaída deixava ver a cuequinha
da cor do top que vestia
também a carninha lisa fresca delicada
que se via no espaço nu
não ocupado pela roupinha

após valente repreensão
da senhora ou mãe que o acompanhava
percebi que o rapaz não entendera a razão
porque levara a reprimenda

claro que os olhares pousaram na ocorrência
chamaram todos os nomes ao rapaz
atrasado mental tarado sexual
aparvalhado

mas o misto de revolta e pena que sentiam
reflectia uma certa dor de cotovelo
pela valentia demonstrada
por parte de quem com muitas mais valias
desejava fazer o mesmo
e não fazia

aquele rapaz
a quem a sociedade chama de apoucado
entre outros nomes bem piores
mostrou afinal ser capaz de fazer
o que os dotados querem fazer
e não são capazes

noite de insónia

Os sons os objectos as imagens
o que os olhos vêem
fora dentro
tudo faz impressão
redemoínhos memórias escuridão

parece que não se ata nem desata
que não se foge nem se fica
que o tempo não passa
que se cai num buraco
sem saída

fica-se com a cabeça prenha
o corpo seco
num sentimento febril
e gelado ao mesmo tempo

apartamento à noite
silencioso
hermético sem destino
apertado pelos ouvidos dos vizinhos

ai que grito por soltar
que uivo
que raiva que me engole
que se engole
que me põe

NADA

que jazigo de vida
aqui esquecido
numa noite indecisa
desequilibrada de insónia

segunda-feira, novembro 12, 2007

o processo de vida é selecção

O processo de vida é selecção
o forte o fraco
o rico o pobre
o que insiste
o que desiste
o que fica de lado
sem qualquer hipótese

depois como tudo se repete
não é fácil a quem fica no chão
se levantar

ao que desiste
encontrar forças para recomeçar

ao menos o rio é sempre rio
porque ser rio já é ser alguma coisa
o resto ele não controla
a falta de chuva
o aumento de detritos
as alterações do seu caudal

e é assim que o rio continua
vive
sem se importar
porque o rio se habituou a aceitar
os naturais desequilíbrios
e a lidar
com a sorte que lhe vai saindo na rifa

ao invés de nós
que nos importamos demais
se calhar...

curiosidade medo pecado

Abraço forte dado suado
a música ambiente vindo de fora para dentro
só sentimento

no arfar do peito aberto
entregue partilhado
no encaixar de pernas e de braços
na inquietação dos lábios e do sexo
colo sítio bom e uterino
seguro

sou filho pai irmão amante
em teu abraço
estou tão bem no teu regaço
tão infantil
que brinco contigo em desejo pueril
curiosidade medo pecado
como fazia nos primeiros passos

aperto afasto receio

encontro permissão
e avanço
nesse oceano quente e ondulado
o teu corpo sensível
penetrante penetrado

ai se a mente adormecesse agora
por mais tempo
se não tivesse o registo do fim
deste momento
e se calasse

se não fosse necessário outro alimento
e ter de sair daqui
deste embalo mel esquecimento
em ti!

sexta-feira, novembro 09, 2007

quanto mais longe melhor

Vai-se a Cancun vai-se às Seichelles
a Punta Cana
até se faz um safari
desconhece-se contudo o que há aqui

afinal como as nações o fazem com as disputas

vão ao espaço exterior
um vai à Lua
outro a Marte
outro a Saturno
porque tem menor visibilidade se a disputa for
mais perto
em prol da comunidade

mais vacinas mais dinheiro
mais nutrição à população
apoio às vítimas de tornados
de racismo
vandalismo
e tanto "ismo" na nação
e que está ali mesmo à mão

mas mostrar à concorrência aos vizinhos
um voo espacial
um foguete nuclear
uma pirueta coisa e tal
isso é que impressiona
e está a dar

assim fazem as nações
com o dinheiro nacional
assim fazem os indivíduos
com o dinheiro individual

quanto mais longe melhor
quanto mais perto pior

porque o que faz impressionar
amigos e inimigos
é o impacto causado
não o gesto com sentido
ou a escolha acertada

sonho em terra agreste

O teu corpo é um convite
despido em pormenores aqui e ali
que aguçam o apetite
agita-se na dança
flexível solto
deslizando no som musical quente

mãos e braços expressivos
finos livres
mais aquecem o ambiente
pondo no ar uma asa de andorinha
um voo lindo

apetece tentar acompanhar-te
voar contigo
atirar com a razão contra a parede
beber tudo o que se sente
no momento
embriagar os sentidos no teu vento

ouço um pastor tocando flauta
o murmúrio dos pinheiros
o marulhar das águas dos ribeiros
os contornos da terra agreste
balouçando em ânimo leve
mais confiante

pedras da minha infância
regatos de água pequeninos
medos espalhados pelos cantos
valeu a pena sonhar
chegar aqui só para te ver
deusa mulher luz e riso doce encanto
cor e alegria nas minhas palavras

enquanto puder
hei-de levar-te semeando o sonho
aonde mais pedras houver
mais medos
mais cardos no caminho

porque um sonho como tu
põe feliz e a dançar qualquer menino assustado
qualquer pastor
qualquer regato pequenino
qualquer recanto triste em terra agreste

quinta-feira, novembro 08, 2007

Mundo em português é pioneiro


Mais e mais as pessoas se misturam
é fácil mudar de lugar
conhecer gente diferente
ir ter com ela
trabalhar estudar
ou muito simplesmente
marcar um encontro ocasional

a mobilidade é já futuro
e só quem quer remar contra a corrente
fica chocado admirado
quando vê a selecção de um país
outrora branco
ter hoje nomes sonantes
jogadores atletas negros
continente africano antigamente

desenganem-se pois os que imaginam
que nada mudou e tudo está como dantes
que brancos são suevos e alanos
negros são os africanos
porque em verdade verdadinha
isso é viver de enganos

tradicional sueca loira neve branca
pode usar já carapinha
ser escurinha
quem sabe Xangai amarelinha
ou até de jeito árabe
em véu embrulhadinha

afinal de contas
Portugal feito Brasil
Brasil feito mundo inteiro
nesta coisa de misturas
mundo em português é pioneiro

quarta-feira, novembro 07, 2007

espaço peito coração

Sondo o interior do corpo em atenção
entro na caixa coração
peito rosa amor e tanta coisa
consigo puxar uma cadeira
sentar-me num canto desse espaço

olhando para cima vejo um tubo
em abertura
semelhante a um respirador
creio ser o caminho da garganta
e do comando superior

aproveito enquanto estou sentado
no amplo e silencioso espaço
para sentir o pulsar do resto

é um sítio calmo sossegado
estremece só de vez em quando
em cima em baixo
quando lá fora os orgãos dos sentidos
captam o que dói mais experimentar

é então que se agita este interior
e a cadeira em que estou sentado
treme

consigo dar conta do ar entrando
entrecortado nos pulmões
tenso agitado
o coração também batendo mais inquieto
com mais velocidade

altos e baixos do exterior
que se reflectem no interior

mas tudo volta ao normal
depois do pequeno terramoto
abranda passa o temporal
e a paz volta

domingo, novembro 04, 2007

pobreza e abundância


Consumo desenfreado
luxo luxo
dinheiro ganho dinheiro por ganhar
a brotar por todo o lado

o que é espelho de um mundo abundante
que se agradece
mas também de tal forma alienado
que faz pensar

em três ou quatro quilómetros que faço
em cada semáforo
da minha cidade
me aparece o extremo oposto
pobreza farta bem à mostra

se somar ao que se vê
o que se não vê
a pobreza escondida
e também a envergonhada

combóio gente tanta carruagem
uns lá bem à frente
outros infelizmente
bem na retaguarda

o que conforta em termos de consciência
é que uns e outros
deixarão um dia esta experiência
vida desigual desequilibrada
combóio mundo com tanta falta de sentido

vida para tantos de extrema crueldade
para todos de ausência de respostas

e para tanto coração que se interroga
e pergunta porquê isto acontece
tanta desigualdade crueldade
tantas outras palavras terminadas em "ade"

ninguém responde porque ninguém sabe nada

o EU e o País

O que se faz com o país
se se fizer bem
é o mesmo que se faz
com cada EU de todos nós

primeiro conhecer-se
avaliar-se
saber a força que se tem

depois abrir ao que é preciso
ao que faz falta
e não se tem

encontrar amigos
sempre juntos no caminho
cuidar deles bem
para não se ficar sozinho

entender-se com aliados conhecidos
mais periféricos que os amigos
mas igualmente indispensáveis

são mais valias
que as rotinas dos amigos
por vezes não alcançam

figurativamente
é como estar no centro
eu
o meu país
abrindo para a periferia

mais e mais sempre avançando
na globalidade da dádiva
e da carência

entre dois caminhos

Sinto dentro um amor arrebatador
que não tem correspondência no exterior
vivências passadas
experiências
entalam um aqui e agora consolado

fico entre o dentro e o fora
quando olho para ti

dizem-mo os olhos quando olham
a renúncia quando avanço
a escolha fracassada

sempre a dificuldade
túnel abismo do cimo da ponte
uma vida entre dois caminhos

vou ou fico?
arrisco ou desisto?

a ti que me olhas perplexa
nestes passos inseguros
lentos
como quem tem rotos os sapatos
e sente as agruras do chão
pelos buracos

eu digo

não julgues tal secura de conduta
que me tortura
e se puderes
com tanto peso que transporto
dá-me a tua mão um pouco de água
alivia esta dor com teu abraço

porque posso parecer morto
nos passos pesados de cansaço
no olhar seco de confiança
quando olho para ti

mas eu te digo flor exterior
encantamento
que bem cá dentro
eu ainda não morri

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